top of page
Foto do escritormaestri1789

Só há um deus, Stálin, e Losurdo é seu profeta!

A apologia ao capitalismo em Fuga da história?, de Domenico Losurdo



Resumo: O artigo empreende análise crítica do livro de Domenico Losurdo, Fuga dalla Storia? La rivoluzione russa e la revolucione cinese oggi, publicada em 3ª edição, em Nápoles, em 2012, pela Editora Scuola de Pitagora. O livro, apresentado em primeira edição em 1999, na Itália, foi publicado no Brasil, pela Editora Revan, em 2004, sob o título Fuga da história? A Revolução Russa e a Revolução Chinesa vistas de hoje. O artigo faz parte de revisão crítica da obra do autor, já realizada no que se refere aos livros Stálin: história crítica de uma legenda negra. (Rio de Janeiro: Revan, 2019) e O marxismo ocidental: como nasceu, como morreu, como pode renascer (São Paulo: Boitempo, 2018). No particular, questiona o método, os processos e as interpretação sobre Revolução Russa e Chinesa e as comparação entre os dois processos, assim como as propostas gerais decorrentes dessa démarche. Aborda as origens político-ideológicas do autor e seus eventuais nexos com suas visões tardias.

Palavras-chave: Marxismo, URSS, China.




Em Domenico Losurdo: um farsante na terra dos Papagaios, ensaiamos crítica aos livros Stálin: história crítica de uma legenda negra e Marxismo Ocidental: como nasceu, como morreu, como pode renascer, do italiano Domenico Losurdo, definido por alguns como pensador marxista extraordinário. (MAESTRI, 2020; LOSURDO, 2019; LOSURDO, 2018.) Fomos impugnado em nossa crítica do autor italiano devido a termos analisado apenas os dois ensaios citados, mesmo sendo o primeiro seu trabalho de maior repercussão e, o segundo, sua última publicação e, consequentemente, a atualização de suas invectivas contra o marxismo revolucionário.


Analisamos agora Fuga da História? As revoluções Russa e Chinesa vistas de hoje, livro publicado em primeira edição, na Itália, em 1999 e, em terceira, revista e ampliada, em 2012. Ou seja, esse seria o primeiro trabalho em que o autor apresenta sistematicamente o “socialismo chinês de mercado” como o “caminho de Damasco” do movimento socialista revolucionário. Estrada possível de ser trilhada, segundo aquele autor, após os “marxistas ocidentais” superarem as pretensas derrapagens milenaristas, utópicas e místicas de viés “judaico-cristão” de Marx, Engels e seus seguidores, como veremos. Impugnação do marxismo revolucionário que Losurdo apresenta sobretudo em Marxismo Ocidental.


Como diversos autores apontam, Fuga da História? prima pela ignorância das determinações econômicas dos fenômenos sócio-políticos e pela superficialidade da argumentação e dos argumentos, apoiados estes últimos comumente em premissas incorretas, das quais se deduzem conclusões lógicas. Também neste ensaio abundam os encadeamentos de propostas axiomáticas, alienadas da realidade histórico-objetiva, sem explicitação dos nexos internos e necessários dos fenômenos. O autor reclama igualmente da personalização do estalinismo em Stálin, mas tende a explicar os sucessos históricos a partir da ação de V. Lênin, J. Stálin, L. Trotsky, Mao Tsé-Tung, Deng Xiaoping etc. Dá pouquíssima atenção à luta de classe em suas interpretações. Há no autor enorme desprezo pelos trabalhadores e permanente negativa da necessária centralidade operária na orientação do devir da humanidade.


O livro constitui-se de reunião de artigos esparsos e algumas entrevistas sobre, no geral, os mesmos temas. Devido ao permanente retorno a questões já analisadas, em geral com os mesmos argumentos, optamos por uma discussão dos temas abordados, e não pela crítica sequencial do texto. As citações traduzidas ao português, a partir da edição italiana de 2012, são de nossa responsabilidade. (LOSURDO, 2012.) Consultamos igualmente a segunda edição, de 1999. O acréscimo de páginas da terceira edição em relação à primeira e à segunda deve-se sobretudo à diagramação e ao maior corpo da letra. (LOSURDO, 1999.)

1. O marxismo judaico-cristão, o utopismo bolchevique, o fim da URSS

Em 1989-91, segundo Losurdo, com a explosão da URSS e das ditas “Democracias Populares”, militantes comunistas teriam aderido através do mundo aos vencedores, renegando a história do “socialismo real” como um todo. (LOSURDO, 1912, p. 23 et seq.) Sempre segundo o autor, em releitura religiosa do passado, eles propuseram retorno às origens, a Marx e a Engels, cultuando apenas os revolucionários “derrotados, que não puderam participar da gestão do poder”, como Gramsci e Ernesto Che Guevara. (LOSURDO, 1912, p. 27.) Esquece que Guevara foi ministro da Economia e Presidente do Banco Central de Cuba. (CORMIER, p. 272 et seq.) Para o autor, após os sucessos da praça de Tiananmen, em 1989, em Pequim, os comunistas “autofóbicos” destacariam-se pelas críticas à China, única nação que seria capaz de defrontar o projeto do “novo século americano”. O italiano praticamente esquece as críticas do marxismo internacionalista, desde 1923, à burocratização da URSS e aos crimes do estalinismo, ou os ataques da direita, com destaque para o “eurocomunismo”, a partir dos anos 1970. (TROTSKY 1963. p. 443-644; CARRILLO, 1977.)


Os comunistas renegados abraçariam a interpretação imperialista da “implosão” da URSS, devido às fraquezas e contradições do socialismo. Losurdo defende, ao contrário, que o “colapso” ou “implosão” da URSS deveria-se essencialmente à pressão imperialista durante a Guerra Fria (1947-1991). (LOSURDO, 2012, p. 31, 33.) Apresenta as razões particulares da vitória dos USA sobre a URSS: entre elas, terem obtido a bomba atômica por primeiro e terem realizado ataque “ideológico-propagandístico” terrível, com destaque para o uso da rádio, instrumento “capaz de transmitir em todas as diversas línguas da União Soviética”, usado para “desagregar a base social de consenso do regime soviético.” (LOSURDO, 2012, p. 40.)


Domenico Losurdo denuncia longamente o imperialismo por ser … imperialista e ter duas caras e duas medidas, que usa segundo seus interesses! Qualquer coisa como descobrir a roda. E, com a apresentação das violências e dos crimes do grande capital, impugna as denúncias e críticas dos crimes e das violências do estalinismo. Impugnação na lógica do: se eles — o imperialismo e o grande capital — fizeram, por que o estalinismo não podia fazer? “(…) elevavam-se a 2.500 as vítimas dos trágicos eventos (sic) de 1956 (na Hungria); nove anos antes, em inícios de 1947, a repressão” pelo Kuomintang — nacionalistas chineses —, em Taiwan, “apoiada pelos Estados Unidos”, causou a “morte de 10.000 pessoas.” (LOSURDO, 2012, p. 48.)


As esdrúxula reflexão lusordianas tem sido contestadas por autores de múltiplas orientações, como, entre outros, o historiador marxista-revolucionário Jean-Jacques Marie, reconhecido internacionalmente como especialista na história da URSS e do movimento comunista. (MARIE, 2020.) Carlos Lopes, por sua vez, define Losurdo como “autor (pouco) preciso” e “neo-hegeliano” e impugna igualmente o uso do princípio jurídico do “tu quoque´”, pelo qual “uma parte que desrespeitou os termos de um contrato não pode exigir de outra o respeito aos termos do contrato”. (LOPES, 3.03.2019.) Losurdo parece ignorar que os crimes do imperialismo dão-se segundo sua natureza e suas necessidades, para impor a ordem do grande capital. E que os crimes do estalinismo deram-se violando a natureza do marxismo revolucionário, para impor a ordem burocrática sobre o poder dos trabalhadores.


Seguindo o argumento de que, se o imperialismo fez, o estalinismo podia também fazer, o italiano empreende o amálgama inaceitável entre “estalinismo” e J. Stálin, de um lado, e o “marxismo”, o “bolchevismo” e Lênin, de outro. “(…) pode-se sustentar que os crimes de Lênin (sic) e de Stálin são piores de aqueles em que Clinton se manchou?” (LOSURDO, 2012, p. 62.) Identifica, assim, a direção compartida de Lênin com o comitê central bolchevique, em defesa da revolução, aos atos criminais e não raro monocráticos de J. Stálin contra o governo soviético dos trabalhadores. Para ele, os atos de V. Lênin e de J. Stálin foram idênticos e desculpáveis devido à “permanente situação de excepção” vivida pelo “regime soviético”. (LOSURDO, 2012, p. 52.)


No mundo das ideias

Domenico Losurdo defende explicitamente que a derrota da URSS foi mais ideológica e cultural do que econômica, material. “Seria entretanto errado super-avaliar o papel da economia naquele sucesso.” O “choque multi-midiático e ideológico teve um papel essencial (…).” (LOSURDO, 2012, p. 43, 70, 33; NUNES, 2014.) “Se houve um colapso na Europa Oriental, ele é ideológico, muito mais do que econômico.” (LOSURDO, 2012, p. 74.) E avança explicação culturalista para a desagregação da base do consenso social na URSS. Para ele, a causa primeira da debacle fora o nascimento do marxismo impregnado do milenarismo, utopismo e misticismo de viés “judaico-cristão” de Marx e Engels, como assinalado. (MAESTRI, 18/02/2020.) E o horror causado pela I Guerra Mundial (1914-1918) teria consolidado aquelas visões utópicas e messiânicas entre as lideranças revolucionárias marxistas e bolcheviques, desorganizando o processo revolucionário como um todo — sempre segundo Domenico.


Para o marxismo revolucionário, o objetivo da revolução é a vitória sobre a ordem nacional-burguesa e o início, no “aqui e no agora”, do governo e da emancipação dos trabalhadores. Tudo no contexto da luta pela construção de uma organização socialista supra-nacional da economia e da sociedade. Uma nova ordem que marche em direção do fim do trabalho alienado, da dissolução do Estado como órgão de constrição social, do avanço do socialismo e, no horizonte histórico, do comunismo. Essas visões horrorizam Domenico Losurdo e, ainda mais, que, em O Estado e a Revolução, V. Lênin reafirme aqueles princípios, para o italiano próprios ao anarquismo. (LOSURDO, 2012, p. 92; LÊNIN, 2012.) A critica do italiano ao marxismo revolucionário é a mesma avançada pelos menchevique já nos primeiros tempos da Revolução de Outubro.(CARR, 1964. p. 118.)


Para Losurdo, ao contrário, a função dos revolucionários marxistas, após despir-se da utopia, do messianismo e do milenarismo, é estabelecerem-se como “novo grupo dirigente” propondo uma “espécie de pacto” “com a nação na sua totalidade” — ou seja, sem exceções de classes. (LOSURDO, 2012, p. 161-2.) Em Fuga da História, ele desdobra-se na defesa da nação, do Estado e da necessidade da associação com a burguesia nacional e internacional, por um longuíssimo período, antes do hipotético início da construção do socialismo. Ou seja, capitalismo, agora, socialismo, algum dia, quem sabe. Em janeiro de 1918, na Rússia, importante dirigente bolchevique respondia a deputado direitista na natimorta Assembléia Constituinte: “Mas de que socialismo estamos falando?” “Do socialismo que chegará em duzentos anos e será conhecido por nossos netos?!” LOSURDO, 2012, p. 118.)


Para Losurdo, os bolcheviques teriam conquistado o poder para “assegurar ao camponês a terra”, ao “povo” “pão e paz” e a “igualdade das diversas nacionalidades que constituem o imenso país (sic).” (LOSURDO, 2012, p. 161-2.) E nada mais. No contexto de revolução necessariamente burguesa, não deveriam ter avançado, como fizeram, a expropriação da burguesia e a construção do socialismo em uma União de Repúblicas Socialistas Soviéticas, de claro viés internacionalista. Essa impugnação do italiano era, precisamente, como já proposto, a tese-base dos marxistas europeus e russos reformistas e pacifistas em 1917. Tese combatida e superada por V. Lênin nas célebres Teses de Abril e impugnada, desde 1906, por León Trotsky, em seu livro 1905: balanço e perspectivas. (LÊNIN, 2018; TROTSKY, 1963.)


O pretenso pacto proposto, realizar uma revolução nacional, sem exclusão da burguesia nacional russa e do grande capital internacional, desrespeitado segundo Domenico devido às necessidades da Guerra Civil (1919-1921) e do Comunismo de Guerra, teria sido restaurado com a NEP, em 1922. Portanto, para ele, os trabalhadores deveriam se submeter ,sem reclamar, por décadas se fosse necessário, a condições de vida mais duras que antes da Revolução, para assegurar a aliança com a “burguesia nacional”, com o capital internacional, tudo para desenvolver as forças produtivas materiais.


Desenvolvimento que propõe como o alfa e o ômega da revolução e do ordenamento social, seguindo estritamente o abecedário da restauração capitalista na China. “O objetivo essencial do socialismo é o desenvolvimento das forças produtivas”, pontificava Jiang Zemin, no 15º Congresso do PCC, ao elevar às estrelas os elogios à restauração capitalista e à “teoria” Deng Xiaoping. Esta última apresentada como “sistema científico relativamente completo, que abraça a filosofia, a economia política, o socialismo científico (…) a ciência e a tecnologia (…)”. Seu perfeito estudo permitiria ao homem bater asas e voar, atravessando os oceanos. (BUCHARIN; PREOBRAZENSKIJ, 1973. p. IX.; ZEMIN, 2000. p. 12.)


Rompendo o pacto nacional

Para Losurdo, o primeiro “pacto” bolchevique, de 1917, rompido com a guerra civil, em 1919, restaurado com a NEP, em 1921, teria sido desrespeitado novamente em 1928, com a impulsão pela burocracia sob a direção de J. Stálin da industrialização acelerada apoiada na coletivização forçada do campo. O autor justifica aquelas iniciativas devido à necessidade de alimentar as cidades e, sobretudo, da URSS preparar-se para a guerra. “(…) ao horizonte se anunciava sempre mais ameaçadora a sombra da guerra: era necessário preparar-se com um adequado processo de industrialização (…).” (LOSURDO, 2012, p. 162.)


Como é habitual ao italiano, para apoiar seus argumentos, ele embaralha datas e fatos. A operação de 1928 deveu-se ao medo da burocracia de restauração capitalista em marcha que poria fim a ela e a seus privilégios. O programa da Oposição de Esquerda defendia, desde 1923, a industrialização acelerada da URSS, em forma planejada, e era acusado de “romantismo industrial”, de “super-industrialista”, de desconhecer as necessidades dos camponeses, pela facção de direita do PCUS, comandada por N. Bukharin, e pela burocrática, sob a direção de J. Stálin. (BUCHARIN; PREOBRAZENSKIJ, 1973; DAY, 1979; TROTSKI, 1923C.) E a guerra chegou à URSS apenas em 1941, treze anos após 1928, dezoito anos após 1923!


Para Losurdo, a coletivizarão do campo teria rompido o pacto com o campesinato e com as minorias nacionais. Entretanto, o autor não se detém sobre o desastre terrível ensejado pela industrialização acelerada e a coletivização forçada, realizadas a facão, sem planejamento, sem condições materiais mínimas, etc. sob a direção da burocracia estalinista. O desastre econômico geral ensejou enorme e desnecessária oposição nas cidades, em facções da burocracia e sobretudo entre os camponeses. Oposição à qual a burocracia respondeu, com correções de rota e, sobretudo, com repressão fluvial que deu origem ao estalinismo — o Grande Terror (1934-1938). (TROTSKY, 1963, p. 464, 490, 539.) Um desastre social monumental, causado pela burocracia estalinista, que serve ao autor para justificar a existência e os crimes da … burocracia estalinista!


A “unidade nacional” teria sido recomposta, sempre segundo Domenico, quando da invasão da URSS pelo exército alemão, em 1941, com a decretação da “Grande Guerra Patriótica” pelo estalinismo, que define como “política de unidade nacional”, para “defender a independência do país” e salvar “todas as nacionalidades” do nazismo. Em verdade, a orientação patriótica estalinista ensejou recuo nas medidas socialistas e facilidades para a economia pequeno-mercantil; reconhecimento da Igreja Ortodoxa como religião nacional; dissolução da III Internacional, etc.


Em crítica ao Fuga da história?, o historiador Sidemar P. Nunes refere-se ao “pacto” patriótico estalinista: “(…) o Estado soviético fez algumas concessões aos kolkhozes (…), permitindo que os camponeses se tornassem proprietários de suas residências e cultivassem parte da área para o consumo próprio e para o livre mercado. Os anos seguintes foram marcados pela disputa pela ampliação da propriedade privada do parque de máquinas agrícolas (…). Na esteira desta mudança outras aconteceram, não somente na agricultura, mas também no âmbito das empresas estatais, que passaram a ter mais autonomia em relação ao planejamento central. Fruto desta relação entre a dinâmica externa e interna, as classes sociais foram sendo recriadas na URSS e, com elas, os interesses de classes.” (NUNES, 2014.)


Stálin, demiurgo da História

Em singular personalização da história, o “Pai dos Povos” é apresentado como demiurgo da vitória contra o nazismo. O autor oblitera o massacre ordenado por J. Stálin, em 1937, da nata das forças armadas soviéticas: 45 mil oficiais presos, 15 mil fuzilados. O estalinismo teria matado mais generais soviéticos do que os nazistas durante a guerra! (MARIE, 2011, 476 et seq.) E Domenico ignora o desconhecimento pelo “marechalíssimo” de em torno de oitenta avisos sobre a iminência do ataque nazista e sua relutância em determinar contra-ofensiva, obrigando os aviões soviéticos a permanecerem em terra e a artilharia a manter-se calada, por 24 horas. Tudo por acreditar que o ataque era provocação de oficiais nazistas querendo obrigar Hitler a romper a palavra dada a ele, Stálin! (MARIE, 2011. 562; PERRAULT, 1967.) Ações que contribuíram para o peso terrível que custou a vitória dos trabalhadores soviéticos em armas sobre o nazismo: mais de dez milhões de mortos.


O novo pacto nacional estalinista teria sido abandonado devido às exigências da Guerra Fria (1947-91), sem que ele explique o porquê. O pacto seria liquidado totalmente, em 1956, por N. Kruschev, com a denúncia dos crimes e “demonização” de J. Stálin — sempre segundo Losurdo. (LOSURDO, 2012, p. 162: Ascesa e declino dello stalinismo, 2012.) O que teria criado uma “crise de identidade” e um “vazio histórico” na população da URSS, traumatizada, ou coisa parecida, com a “Revolução de Outubro”, em 1917; com a Guerra Civil, em 1919; com a coletivização dos campos, em 1928; com a denúncia de J. Stálin, em 1956 — esta última teria retirado a confiança popular no demiurgo de aço da vitória sobre o nazismo, segundo o italiano. Aproveitando aquele vazio, N. Kruschev propusera um “novo pacto totalmente irrealista” e “mirabolante”, segundo os disparates utopistas e messianismo de Marx e Engels, superados anteriormente pelo estalinismo. (LOSURDO, 2012, p. 163-4.)


O autor não se refere às razões sociais, econômicas e políticas da desestalinização controlada e das medidas de descompressão limitada tomadas já por G. Malenkov (1902-1988), no comando da URSS em 1953-1955: anistia de presos; controle da polícia política; fim dos “processos secretos” e das condenações, deportações e execuções sem julgamento; fim das penas familiares e coletivas; melhorias do código e da disciplina de trabalho estalinistas; limitações das desigualdades quanto à alimentação, moradia, salário, pensões; maior produção de bens de consumo; retorno ao regime de quarenta horas de trabalho! (DEUTSCHER, 1961. p. 9 et passim.)


O fim da URSS deveria-se, portanto, ao abandono do “pacto nacional”, após a morte de J. Stálin, pelo “pacto social” de Malenkov-Kruschev, com a acolhida muito limitada dos anseios da população e dos objetivos de 1917, devido à situação semi-explosiva que o país vivia. Movimento que não democratizou o poder e esmoreceu após os sucessos da Hungria, em 1956, e na Era Brejnev (1964-1982). Para o italiano, o novo pacto utópico e messiânico teria levado à desorganização e à indisciplina da “fábrica” soviética, em uma sociedade que veria no comunismo o “ócio generalizado”. Prevaleceria naquele contexto um “difuso clima ideológico” que levava a caracterizar como “restauração do capitalismo” qualquer tentativa de “racionalização do processo produtivo”. Dos dias de gloriosa e acelerada construção do socialismo sob o chicote de J. Stálin se passara ao carnaval do ócio e da prodigalidade da Era Malenkov-Kruschev! (LOSURDO, 2012, p. 74; Idem. 2008, p. 246 et seq.; FRYER et al., 2006)


Ódio aos trabalhadores

Losurdo defende, nos fatos, a volta aos níveis de consumo e aos códigos draconianos de trabalho, com os campos de trabalho forçado, da Era Estalinista (1934-53), como solução para uma crise econômica que propõe de origem ideológica! Na sua visão de mundo, os trabalhadores deveriam ser explorados, até o limite de suas energias, com métodos autoritários, nas fábricas e nos campos de trabalho forçado estalinistas, que ele define sem pestanejar, em alguns de seus momentos, quase como campos de veraneio e formação profissional! Qualquer coisa como parques Disney no Ártico! (LOSURDO, 2008, p. 246 et seq.)


Segundo Losurdo, na nova ordem burocrática pós-estalinista, nascida da morte do “Pai dos Povos”, engambelada pelas promessas utópicas, que jamais se realizavam, no contexto da gestão burocrática, etc., a população soviética caíra no desânimo, perdera a consciência socialista conquistada no estalinismo, permitindo a vitória político-ideológica da propaganda do grande capital. Aí estaria a razão da indiscutível “implosão” da URSS, já que se deu sem ataque militar do imperialismo e da OTAN, como se esperava.

O autor nega a estagnação econômica conhecida pela URSS e pelas “Democracias Populares”, ensejada pela administração burocrática e parasitária, pela falta de autonomia dos trabalhadores, pela organização nacional da economia e sociedade dos Estados operários, etc. como motivo central da ruptura do consenso social. Paradoxalmente, foram o capital e o imperialismo que avançaram mais, em um sentido patológico mas real, a internacionalização da produção —globalização— proposta pelo marxismo revolucionário e anatematizada pelo “socialismo em um só país”.


A defesa lusordiana da constrição permanente dos trabalhadores para o crescimento da produção impugna qualquer organização soviética da sociedade ou democracia operária. Domenico define os órgãos soviéticos de poder como romantismo próprio aos primeiros tempos da revolução, que deve dar passo a uma ordem madura e autoritária governada desde o alto, já que o arrocho do mundo do trabalho oporia os dirigentes à base. Os dirigentes devem manter a autonomia de mando e apenas um elo político e ideológico com os de baixo. Ou seja, nada de beijos e abraços entre dirigentes e o proletariado, na ordem socialista abençoada pelo italiano. Visão que justifica o autoritarismo burocrático-estalinista, por um lado, e o capitalista, por outro, imposto na China atual. O autor abraça firme a visão de que “pouco importa a cor do gato desde que ele capture o rato”.


Nação, nacionalismo, Estado

Em um viés burguês oitocentista, Losurdo trava batalha de retaguarda, defendendo a necessidades eternas da “nação”, território multi-classista de exploração do mundo do trabalho, e do Estado, órgão de constrição social dos “de baixo” pelos “de cima”. Compreende-se sua ojeriza às propostas marxistas de organização internacional dos países de economia nacionalizada e planificada e de superação da opressão de classe e do próprio Estado, mesmo no horizonte histórico. Nação e Estado construídos sobre as costas e com o suor de trabalhadores sem futuros, verdadeiros inimigos do italiano, já que eternamente querendo trabalhar um pouco menos e viver um pouco melhor.


Losurdo propõe que o Partido Bolchevique soubera construir uma teoria para o assalto ao poder, mas jamais dispusera de teoria de administração do poder, ao se engolfar nos, para ele, sonhos da construção socialista e da luta internacionalista. Avança como outra prova dessa incompetência política de Lênin e de seus pupilos a incapacidade de construírem teoria, para a URSS, de gestão das relações com as Democracias Populares, com a Iugoslávia, com a China, etc. fora de ótica hegemônica. Também aqui, jamais aborda essas contradições nacionais como produtos necessários da proposta de construção isolada das sociedades e economias dos Estados operários, segundo a doutrina nacionalista “do socialismo em um só país”, em oposição ao princípio de superação internacionalista das nações, no contexto de suas singularidades.


As razões da destruição da URSS e dos Estados operários são imputadas a insuficiências e a enganos da aplicação do marxismo, como teoria, ocorridas no mundo das idéias, e, jamais, como idéias e políticas nascidas no contexto das classes em luta, quando dos fluxos e refluxos da revolução mundial. Como proposto, o autor quase ignora as determinações econômicas e da luta de classes em suas interpretações sociais e históricas. “O livro não apresenta análise propriamente econômica, que deveria ser a base de uma abordagem marxista”— lembra com razão o já citado S. Nunes. (NUNES, 2014.)


As traições ao marxismo e os crimes da burocracia contra o poder soviético não seriam decorrências da luta da burocrática para impor seus privilégios sociais, como proposto sobretudo pelos “trotskistas”. “Como é sabido”, a questão da “revolução traída” foi “um tema particularmente caro a Trotsky” — pontifica o italiano (LOSURDO, 2012, p. 129.) Losurdo corrige esse erro de interpretação. “Para limpar o campo da pseudo-explicação do tipo idealista” devemos “substituir a categoria de traição” pela “de aprendizado”. (LOSURDO, 2012, p. 90.) Deslizes como a traição da revolução alemã, espanhola; o Grande Terror (1934-38); os Processos de Moscou; o Pacto Stálin-Hitler, etc. seriam “erros” de “aprendizagem” da gestão de Estado operário atacado pelo imperialismo e, portanto, compreensíveis e desculpáveis. Estranho abandono do mundo das explicações idealistas!


A terrível crise histórica que vivemos não seria resultado da resolução da luta de classes em desfavor do mundo do trabalho, mas de erros de gestão política por falta de experiência. Erros motivados em grande parte por teoria de raiz judaico-cristã criada por Marx e Engels e seus epígonos, como vimos. Portanto, o uso da categoria “processo de aprendizagem”, sugerida pelo italiano, exigiria, por um lado, a “des-demonização de Stálin” e, por outro, logicamente, a “descanonização de Marx e de Engels” e, por consequência, dos teóricos marxistas “clássicos”. (LOSURDO, 2012, p. 155.) Portanto, os marxistas e revolucionários de hoje devem deixar de lado tudo que aprenderam e voltar à escola, para “reeducação” segundo a métrica lusordiana.


Domenico propõe, sem enrubescer, por um lado, refundar o marxismo com a sua louvação da URSS dos tempos do “Guia Genial dos Povos” e da China de Deng Xiaoping. E, por outro, com o envio por correio expresso de Marx, Engels e dos teóricos-combatentes do marxismo internacionalista para a lixeira da história. Como o italiano deixou claro, também em O marxismo ocidental, igualmente sem pejo, ele não só anuncia a morte do marxismo mas a sua restauração losurdista! Portanto, gritemos, todos: "La illa Allah Muhammad rasul Allah!” — Só há um deus, Stálin, e Losurdo é seu profeta!


Losurdo anti-comunista e pró-imperialista

É descomunal a pretensão de Losurdo de se levantar como profeta da restauração do marxismo. Logo ele que jamais tirou o pezinho do bem pago mundo acadêmico italiano. E, mais ainda, com um passado deveras comprometedor, sobre o qual pouco se sabe e pouco se fala. Por longos anos, o italiano teria apoiado ativamente a campanha contra a URSS, contribuindo, assim, mesmo em forma infinitesimal, para sua “explosão”, que lamentaria, décadas mais tarde, com lágrimas de crocodilo. Mas vamos aos fatos que esperam elucidação ainda mais precisa.


Domenico Losurdo teria despontado na política como admirador fervoroso, já não tão jovem, de Mao Tsé-Tung e de seu “pensamento”, do “Grande Salto Adiante” e da “Grande Revolução Cultural Proletária”, iniciada em 1966, quando já tinha 27 anos. Não sabemos quando aderiu ao Partido Comunista da Itália (marxista-leninista) — PCd´I (m.-l.) —, formado, em 1966, por militantes operários rompidos com o PCI e por jovens radicalizados. (Note su Domenico Losurdo, 2009.) O PCd´I (m.-l.) foi o principal movimento maoísta italiano, reconhecido pela China e pela Albânia, que teria reunido, nos melhores momentos, em torno de vinte mil militantes. (DUBLA, s.d.)

Losurdo jamais teria participado da direção máxima dessa organização. Integrou, entretanto, o comitê nacional de redação de Nuova Unità, semanário do PCd´I (m.-l.) que antecedeu a sua fundação. Já em 1975, com outros militantes, encontrava-se em dissidência com a direção do partido. Em 1976, ele e Michele Martelli, também filósofo e professor universitário em Urbino e Bari, foram expulsos do PCd´I (m.-l.) Em 21 de dezembro daquele ano, a redação de Nuova Unità respondeu, com o artigo “Teóricos da servidão”, ao documento mimeografado no qual os dois acadêmicos apresentaram suas dissensões políticas com o PCd´I (m.-l.). (Nuova Unità, 21/12/1976.)


As razões políticas dos dois professores são assustadoras. Losurdo e Martelli acusariam a direção do PCd´I (m.-l.) de privilegiar a luta política contra o imperialismo estadunidense; contra a Democracia Cristã, o principal partido da burguesia italiana; e contra o MSI, o mais forte movimento neo-fascista peninsular, envolvido em conspirações e atos terroristas. Segundo eles, a contradição política dominante não seria, com propunha aquele partido, entre o “proletariado e a burguesia”. Trataria-se de questão nacional.


Losurdo e Martelli exigiam o abandono da luta de classe nas fábricas e da mobilização anti-capitalista e anti-imperialista na Itália. Impugnavam a consigna do PCd´I (m.-l.) de “controle operário e popular sobre os centros vitais da economia” e de formação de conselhos de fábrica. Os dois filósofos defendiam que os trabalhadores italianos deveriam ficar quietos e obedientes, pois haveria um combate muito, mas muito mais sério do que a luta de classes. Ou seja, a defesa da nação e do Estado italianos. O que é, vimos, uma fixação permanente de Losurdo. Mas, a defesa da Itália, por todos, como um todo, contra quem?

Contra a URSS que, em conluio com o PCI, estaria procurando a “instauração de um ditadura aberta social-fascista” no Bel Paese! Diante da ameaça da invasão soviética, defendiam o fortalecimento das forças armadas italianas, da OTAN e tratar as tropas de ocupação estadunidenses na península como parte do esforço para a “guerra de resistência nacional” contra a URSS e o PCI. Os redatores do artigo de Nuova Unità lembravam aos dois que, se os militante do PCd´I (m.-l.) defendessem tais propostas, seriam considerados pelos trabalhadores como “anti-comunistas e contra-revolucionários”. Formulação elegante para não caracterizar os dois catedráticos como tal.


Losurdo denuncia o Perigo Vermelho

A proposta da URSS como ameaça à “independência nacional” da Itália e da Europa e a necessidade de união nacional dos trabalhadores com o imperialismo, a burguesia e os fascistas em defesa da independência italiana não era alucinação restrita aos dois professores de filosofia. Ela traduzia, para a Itália, a aliança anti-URSS, entre Pequim e Washington, consagrada em 1971-2, quando do anúncio e a seguir a visita de Nixon à China. E, o que era péssimo, ficou ainda pior. Após os beijos e afagos com Nixon, Mao Tsé-Tung e o Partido Comunista Chinês interromperam o apoio a movimentos de libertação nacional através do mundo e passaram a combatê-los, quando era necessário para enfraquecer a URSS.


Aquele acontecimento inesperado dilacerou o movimento marxista-leninista através do mundo, com destaque para a Itália, onde ele era profundamente anti-imperialista. Desde o fim da Segunda Guerra, a Itália seguia ocupada por tropas estadunidenses e a Democracia Cristã era expressão direta da política ianque no país. Aquela reorientação levou a direção do PCd´I (m.-l.) a iniciar rompimento com Mao Tsé-Tung e com o PCC, sob a pressão de suas bases.


Losurdo e Martelli apresentaram crítica por escrito ao que definiram como “Ataque à política exterior da República Popular Chinesa” da direção revisionista do PCd´I (m.-l.). No documento, defendem a aliança de Pequim e Washington contra a URSS, produto do “potente” “pensamento de Mao Tsé-Tung”. Justificam as relações exteriores do governo chinês com “este ou aquele país”, sem se referirem ao apoio do PCC ao governo ditatorial de Pinochet, no Chile, em 1973. Apresentam o “social-imperialismo” soviético como o grande inimigo e definem o FNLA e a Unita como movimentos de libertação, grupos terroristas financiados respectivamente pela África do Sul-USA e pelo Zaire-China, responsáveis pela morte de milhares de angolanos.


Losurdo e Martelli subscrevem efetivamente a definição do apoio internacionalista ao MPLA, por parte da URSS e de Cuba, como, respectivamente, ação do “social-imperialismo soviético” e de “suas tropas mercenárias” — isto é, os internacionalistas cubanos —, que constituiriam a agressão mais “grave” jamais conhecida na “história do movimento de libertação nacional na África desde o fim da segunda guerra mundial”. Ou seja, os professores apoiavam, sem pestanejar, não apenas o ataque imperialista à URSS como a contra-revolução em Angola. Mais de dois mil combatentes voluntários internacionalistas cubanos morreram enfrentando sobretudo tropas da África do Sul. (PESCE, 11/1976, p. 204.)


Em documento da mesma época, posterior a expulsão, assinado pelo Comitê Provincial de Pesaro-Urbino, ou seja, Losurdo, Martelli e alguns outros poucos militantes daquele organismo regional, retomam a proposta anti-comunista e pró-imperialista do “social-imperialismo” da URSS como a maior ameaça à humanidade e a bondade da política externa chinesa, contra ventos e maré. Nesse momento, o processo de restauração capitalista já se consolidava no país e se transformaria em política oficial, dois anos mais tarde, em dezembro de 1978, com Deng Xiaoping, como veremos.


Os quatro grande mestres

No documento, após saudação aos “quatro grandes mestres do proletariado mundial — “Marx, Engels, Lênin e Stálin”, à “grande Revolução Cultural Proletária” e a Mao Tsé-Tung como o “maior marxista da era contemporânea”, reafirma-se o “social imperialismo soviético” como o “principal foco de guerra” de então e nega-se sua equiparação aos Estados Unidos. (PESCE, 11/1976, p. 205-208.) A seguir, Domenico Losurdo teria continuado, por anos, como garoto propaganda da política internacional chinesa contra a URSS, próximo a micro-organizações marxistas-leninistas italianas incondicionais da China.


Em 4 de novembro de 1978, já como membro do fantasmagórico e pró-chinês Partido Comunista Unificado da Itália (marxista-leninista), de Osvaldo Pesce, Losurdo tentou proferir, em nome de uma “Associação Itália-China”, conferência em defesa da “acerto” da política externa do PCC, em Livorno, cidade vermelha e operária. Apenas começava sua defesa da teoria maoísta dos “três mundos”, da platéia, exigiu-se que explicasse o apoio da diplomacia chinesa ao Xá da Pérsia e a Augusto Pinochet, ditador do Chile, sobre os cadáveres de milhares de militantes anti-ditatoriais. Naquele momento, enfuriava, no futuro Irã, a luta popular contra a ditadura sangrenta de Mohammad Reza Pahlavi.


Não prosperaram as tentativas de tergiversação de cunho histórico e filosófico de Losurdo, entre elas a lembrança que os “Estados Unidos” eram o “país que por primeiro”, no século 18, “lutou pela independência contra o colonialismo”. E, ao defender o caráter progressista da burguesia, uma outra sua permanente proposta, a platéia formada em boa parte por operários e militantes marxistas-leninista se inflamou e o professor começou a ser destratado como “fascista” e “vendido à Cia”. Enquanto era esputado pelos presentes, Domenico escafedeu-se, antes que não apenas seu amor-próprio fosse machucado. A noticia foi dado pelo jornal Nuova Unità, sob o título “In una conferenza a Livorno: Cacciato il professor di revisionismo cinese.” (Nuova Unità, 14/11/1978, p. 4.)


Nos anos oitenta, Domenico Losurdo, em radical transformismo, colocou-se à sombra do então poderoso Partido Comunista Italiano, já plenamente embrenhado no “euro-comunismo”, ou seja, na colaboração de classe defendida pelo italiano anteriormente, em nome do combate ao “social-imperialismo” da URSS. Deixando de lado tudo de mal que dissera daquele partido “revisionista” e aliado privilegiado da então por ele odiada URSS, passou a escrever gentis artigos no prestigioso jornal, já muito longe de sua passado “marxista-leninista-pensamento do presidente Mao Tsé-Tung”.


Quando a URSS e o PCI ruíram, o professor transferiu-se para a Refundação Comunista e, a seguir, colocando sempre pedras sobre seu passado anti-soviético, encontrou o nicho político que o levaria ao sucesso sobretudo no Brasil. Ou seja, a comparação elogiosa do sucesso da China, através da restauração capitalista, em relação ao fracasso da URSS socialista, que conhecera “implosão” para o qual ele colaborara, ainda que em forma microscópica, durante longos anos.


Nos últimos anos, Domenico Losurdo militava em organização que abiscoitou sem sucesso a denominação do antigo e poderoso Partido Comunista Italiano. Essa micro-organização de viés neo-estalinista eclético inspira-se, entre outros, em Palmiro Togliatti, estalinista raiz, e Enrico Berlinguer, expoente do “eurocomunismo”. J. Stálin é referência presente mas menos explícita. O novo PCI apoia o presidente sírio Bashar al-Asad, o presidente cinese Xi Jinping e a política exterior de Putin e do Partito Comunista da Federazione Russa, nacionalista, religioso e neo-estalinista, quando à política interna.


Em busca do paraíso chinês

Losurdo ataca a democracia operária e defende a imposição de ritmos produtivos draconianos aos trabalhadores. Acusa Marx e Engels por propor o “superamento dos antagonismos de classe e das classes sociais” e a extinção do “Estado”. (LOSURDO, 2012,. p. 92.) Desanca o internacionalismo e acaricia a nação e o nacionalismo. Empreende ataque geral a O Estado e a Revolução, de V. Lênin e à tese marxista da dissolução do Estado, no horizonte histórico. Sobre a crítica do italiano ao leninismo, S. Nunes lembra: “O autor também não distingue Estado de administração da economia (…) o que o leva a aproximar o marxismo ao anarquismo. A análise correta deveria ser sobre as funções repressivas do Estado, não da forma de planejar e distribuir os bens necessários.” (NUNES, 2014.)


Losurdo responsabiliza pela destruição da URSS, para além das minudências, a ofensiva “ideológico-propagandística” do imperialismo contra um Estado enfraquecido pelo “pacto” messiânico e utopista de marxismo que nascera embebido de milenarismo judaico-cristão, como registrado. Tradição que exigia a luta pela emancipação dos trabalhadores, no “aqui e no agora”, sem as escusas de deverem trabalhar como escravos em prol de um deus ou de uma fé ou de um patrão ou de uma nação, para serem recompensado apenas após a morte, em um paraíso distante.


Mas qual seria, então, a superação losurdista do marxismo, em um sentido positivo? A direção da URSS deveria ter deixado de lado qualquer proposta de luta pela emancipação dos trabalhadores, como no período estalinista, esfolando-os em favor do desenvolvimento das forças produtivas materiais. Isso, no contexto de uma ampla abertura ao capital internacional e recuperação da burguesia nacional, através do pacto com a “nação na sua totalidade”, constituído com a implementação de uma NEP eterna. O erro da URSS teria sido não seguir o modelo chinês, o “caminho de Damasco” da revolução nacional. (LOSURDO, 2012, p. 161.)


A China, sim, tomara o caminho certo, após alguns tropeções, quando se desviou do pacto inicial, que não comportaria a construção do socialismo. “O pacto (chinês) era portanto baseado na promessa de por fim à condição semicolonial e semifeudal da China.” (LOSURDO, 2012, p. 165.) O sucesso chinês se deveria ao PCC não estar contaminado pela “tradição messiânica-ebraico-cristã” marxista e bolchevique e ter, finalmente, desenvolvido as forças produtivas materiais, após 1978, estendendo o tapete vermelho à restauração capitalista, ou seja ao “socialismo de mercado” (LOSURDO, 2012, p. 168.)

V ejamos, portanto, de mais perto, a defesa amorosa losordista da restauração capitalista na China, que propõe como a recuperação do marxismo revolucionário de seu inferno “judaico-cristão”.


2. China: a redenção capitalista

Na visão de Losurdo, duas propostas digladiaram-se na URSS. A da utilização do país para impulsionar a Revolução Mundial, como mandaria a receita messiânica- hebraico-cristiana-marxista, defendida na época por León Trotsky. A segunda, vitoriosa, propunha a construção do socialismo exclusivamente na URSS, sem revolução mundial, rompendo com as visões emancipatórias de raízes judaico-cristãs dos fundadores do marxismo. Avançada por Stálin, ela enfatizara a defesa da nação, sem maiores preocupações com a população. A apresentação do italiano é distorcida. Vimos que a proposta de L. Trotsky e da Oposição de Esquerda, derrotada e esmagada em 1927-29, defendia, desde 1923, a industrialização acelerada da URSS, o fortalecimento do proletariado e do poder soviético, em um país em que dominava a “ditadura em nome do proletariado” e não a “ditadura do proletariado”. O programa da Oposição de Esquerda propunha transferência sobretudo econômica, tributárias, etc. da renda rural pequeno-mercantil para financiar a industrialização socialista.


O programa de reindustrialização acelerada proposto pela Oposição de Esquerda era combatido pelos defensores da industrialização a passos de cágado ou “minúsculos”, com a abertura para a produção capitalista. Essa última opção era apoiada firmemente por N. Bukharin, que defendia caminho que levaria ao restauracionismo, e por J. Stálin, representante da burocracia. Era a proposta de uma NEP sem fim. (COHEN, 1990. p. 211.) E dezembro de 1928, quando era já claro que a produção capitalista se consolidava, sobretudo no campo, enquanto a área socialista patinava, nas cidades, ensejando a possibilidade da contra-revolução e do desaparecimento da casta burocrática, esta última, dirigida por J. Stálin, rompeu com N. Bukharin, apropriou-se do programa industrialista da Oposição de Esquerda e liquidou em forma brutal a NEP e a produção pequeno-mercantil rural.

Na URSS, estiveram na mesa apenas dois projetos e, sobretudo, duas possibilidades: a construção do socialismo ou o retorno ao capitalismo, derrotado temporariamente em 1928 e vitorioso em 1991. A grande divergência entre a proposta da Oposição de 1923 e sua implementação estalinista era o caminho a ser seguido para a industrialização. A primeira propunha o financiamento da industrialização com a transferência soft de recursos dos campo: impostos, preços diferenciados, etc., como assinalado. A segunda, empreendeu a coletivização violenta, burocrática e militarizada, com sequelas jamais superadas pela URSS.


Na China, mutatis, mutandis, disputaram-se a proposta burocrático-estalinista de coletivização do campo, para industrialização do país, sem as condições materiais mínimas, dirigida pelo núcleo da burocracia maoísta inicialmente hegemônico, e a proposta restauracionista de N. Bukharin, de uma NEP eterna, defendida por Liu Shao-chi, Deng Xiaoping, Zhao Zyiang, Hu Yaobang, entre outros dirigentes comunistas. Losurdo esforça-se para apresentar a restauração capitalista na China como uma terceira alternativa, nascida da sabedoria chinesa, não infeccionada pela “tradição messiânica hebraico-cristã” marxista e bolchevique. Vitoriosa, em 1979, ela desenvolveria a economia chinesa com o aporte do capital internacional e produção de capital nacional, com enorme exploração dos trabalhadores, com referências formais e retóricos decrescentes ao socialismo.


China maravilhosa

Em visão romantizada da civilização chinesa, Losurdo fala de “povo de antiquíssima civilização”, com “literatura florescente” e “espírito laico”, sem guerras de religião, onde o “privilégio de nascimento” era bem menor do que na Europa. Império que, no século 18, não precisaria importar qualquer “manufaturado” do exterior — “não temos falta de nada” — teriam proposto suas autoridades máximas. Onde “altos cargos administrativos” seriam ocupados por “concurso público” etc. Um paraíso na terra violado, no Oitocentos, por bárbaros da “raça branca dos senhores”, chegados do Ocidente, que, com as Guerras do Ópio, colocaram o império milenar de joelho, causando “abaixamento geral e drástico do nível de vida, a desagregação do aparato estatal e governativo”.(LOSURDO, 2012, p. 194 et seq.)


Difícil saber por que uma nação refinada, de centenas de milhões de habitantes, ruiu diante de tropas escassas de europeus bárbaros e seus mercenários, enquanto o Japão venceu semelhante pressão e tornou-se nação imperialista. A narrativa lusordiana ignora o atraso do “Império do Meio”; as autoridades corruptas; os letrados elitistas; os camponeses esmagados pela exploração, trabalhando propriedades minúsculas, com técnicas e instrumentos rústicos. O grande responsável pela vitória ocidental foi o arcaísmo da formação semi-feudal chinesa e a debilidade da burguesia nacional que, apenas em 1911, impôs a República e viu o país mergulhar na desordem, superada apenas em 1949, pelo PCC. (GUILLERMAZ, 1970. p. 533 et seq.)


Para o autor, a Revolução Chinesa teria dois grandes objetivos: superar o “desmembramento do território”, nascido do “século da humilhação”, e desenvolver as forças produtivas materiais. Ponto final. Lembra que Mao Tsé-Tung propusera, antes de 1949, seguindo a cartilha estalinista, que, após a tomada do poder, empreenderia-se, por longo período, a expansão da economia capitalista para, apenas feito isso, marchar ao socialismo. “Por seu caráter social, na primeira fase ou no primeiro passo, a revolução de uma colônia ou semi-colônia é fundamentalmente uma revolução democrático-burguesa, e, objetivamente, o seu objetivo é limpar o terreno ao desenvolvimento do capitalismo (…).” (LOSURDO, 2012, p.195, 258, 173; MAO TSÉ-TUNG, 1972, p. 84.) Tese impugnada por Trotsky, desde 1905, com a proposta da Revolução Permanente, e liquidada por V. Lênin, com as Teses de Abril, como vimos.


O italiano não explica por que, de 1949 a 1955, o PCC avançou rapidamente em direção ao socialismo, através da expropriação das grandes industrias e do 1º Plano Quinquenal, com sucesso real, para o qual contou com o apoio da URSS. Iniciativa que se deu, porém, incorporando ao Estado e ao governo inúmeros membros do antigo Kuomintang e indenizando 1.140.000 de proprietários de indústria snacionalizadas, a 5% durante sete anos, alguns com somas enormes, ação de nefastas consequências, como veremos. Um grande número dos ex-proprietários seguiram administrando suas antigas empresas. (MAITAN, p. 11, 20: MAO TSÉ-TUNG, 1972, p. 84; DINUCCI, 1975, 31.) Após 1949, seguiu dominando no país, por décadas, a imensa população camponesa que praticava economia pequeno-mercantil e de subsistência.

Segundo Losurdo, em uma visão simplista, em 1956, devido a problemas internacionais e ao medo da agressão externa, fora proposto pela direção do PCC o “Grande Salto Adiante”: desenvolvimento ultra-acelerado, apoiado na “militarização do trabalho”, “em uma onda” de “entusiasmo de massa”, de “forte senso comunitário” e de “radical camaradismo”. (LOSURDO, 2012, p. 179.) A realidade foi bem diferente que as consignas publicitárias da época. A direção maoísta impulsionou coletivização forçada do campo que podemos aproximar, no geral, à empreendida, em 1929, pela burocracia na URSS, apenas com meios mais softs, já que, na China, o proletariado industrial era mínimo, em relação aos camponeses, que haviam realizado a revolução, na qual os trabalhadores urbanos participaram tardia e marginalmente.


Grande salto, queda maior

O Grande Salto propunha acelerar a industrialização com super-exploração do que se tinha em abundância, a força de trabalho camponesa. O território nacional foi dividido em milhares de “comunas populares”, com em torno de cinco mil famílias, 4.500 hectares de terras úteis e até cem mil habitantes, cada uma. Coletivizaram-se as parcelas agrícolas familiares, já associadas em cooperativas. Grupos de “produção”, de 20 a 50 famílias, com cem a 150 camponeses, exploravam em torno de 15 a 50 ha. de terra útil. Diversos grupos formavam uma “brigada de produção”, com de 150 a 200 famílias, e uns 150 ha. de terras agricultáveis. A comuna tornava-se a nova circunscrição econômico-administrativa, de vocação polifuncional e tendencialmente auto-suficiente.

Os bens dos camponeses passavam para a comuna — grãos, gados, ferramentas, moradias, adubos, árvores frutíferas. Trabalhadores sobretudo solteiros foram alojados em dormitórios. Em fins de 1958, funcionavam 3.400 mil refeitórios coletivos. Criaram-se lavanderias comunitárias. O pagamento dos trabalhadores das “comunas” era em bens e serviços e algum salário monetário. Após o Grande Salto Adiante e seus três anos de sacrifícios, reinaria a abundância, prometera-se. A Inglaterra seria alcançada em quinze anos. (GUILLERMAZ, 1973. p. 232-250; LETIZIA, 2012. p. 105-7; MAITAN, 1969, p. 31-48.)


O objetivo da nova organização era, aumentando a jornada e o ritmo de trabalho e comprimindo o consumo, avançar a produção agrícola e sobretudo liberar mão-de-obra para a produção manufatureira nas comunas, sobretudo, e nas cidades, secundariamente. Finalizados os trabalhos nos campos, as “brigadas” construíam canais de irrigação, açudes, pontes, represas, estradas; exploravam pequenas minas de carvão, pedreiras, olarias, etc. Para obras mais portentosas nas comunas, utilizavam-se as “brigadas de trabalho”. Pretendia-se “mobilização apocalíptica da energia muscular de todo um povo.” (MENDE, 1962, p. 8.)


A descentralização do Grande Salto Adiante pusera fim ao planejamento da produção nacional. Espalharam-se as máquinas de grandes manufaturas pelas comunas rurais. Pretendeu-se substituir as siderurgias por milhares de micro alto-fornos rurais que produziriam toneladas de aço. Fundaram-se milhares de pequenas “Empresas de Cantão e Povoado” nas “comunas populares”, de propriedade comunal-cooperativada. As orientações técnicas foram substituídos por palavras de ordem. Os conselheiros soviéticos ficaram desnorteados. O Grande Salto foi sobretudo rural. Nas cidades, organizaram-se apenas umas 60 mil pequenas oficinas, 180 mil refeitórios, 120 mil creches, liberando sobretudo mão de obra feminina. A implementação do Grande Salto em meio urbano foi logo abandonada. A nova ordem político-ideológica produziria um novo homem e revolucionaria as relações sociais de produção, pondo fim ao individualismo, ao sentido da propriedade, ao dinheiro, à divisão entre trabalho intelectual e manual, à própria família. Estava-se marchando em direção ao comunismo, afirmou-se. (GUILLERMAZ, 1973. p. 232-250; BETTELHEIM, 1976. p. 86 et set,)


Desastre na esquina

Com o fim do planejamento central, a produção industrial emperrou, por falta de matérias-primas e peças, excesso de produção, dificuldade de escoamento dos produtos, etc. A pequena produção comunal de adubos foi um fracasso. Os micros alto-fornos produziram aço de baixa qualidade, inservível à indústria, a preço superior ao das siderurgias. Como na URSS, empreendeu-se coletivização da agricultura com os instrumentos-técnicas da agricultora familiar. A nova ordem ensejou trabalho mais longo e mais exaustivo e decadência das já precárias condições da vida rural. Tentou-se militarizar o trabalho — “uma fábrica é um campo militar. Diante às máquinas o operário é disciplinado como o soldado.” Da exaltação e incentivos ideológicos, políticos e morais, passou-se à coerção. Foi imensa a oposição camponesa ao Grande Salto. A adesão entusiasta do mundo rural à iniciativa, com os membros das “brigadas de trabalho” partindo aos campos entoando hinos revolucionários e alçando bandeiras vermelhas ficou restrita à propaganda do PCC, que galvanizou sobretudo estudantes universitários europeus. (GUILLERMAZ, 1973, p. 232.)


Já em 1959, começou a ter-se a dimensão de desastre que, ajudado por acidentes climáticos regionais habituais e pela suspensão da ajuda soviética, em 1960, causaria milhões de mortos de fome. O salto fora grande, a queda ainda maior. Introduziram-se algumas correções ou ajustes. Foram determinados um mínimo de oito horas de sono e quatro para pausas no trabalho e repouso; uma maior parte do pagamento em salário monetário; que bens entregues à comuna seguiriam sendo propriedade particular, etc. Em 1960, agravando-se a situação, abandonou-se a política de desenvolvimento harmônico da indústria e da agricultura, “andar com as duas pernas”, por verdadeira batalha agrícola, para salvar o país da fome. O país foi obrigado a importar alimentos de países capitalistas.


Era o fracasso do objetivo do Grande Salto — a industrialização acelerada. Pouco a pouco, as comunas perderam os objetivos iniciais para se transformar em regiões administrativas. A coletivização da agricultura foi reduzida sobretudo ao nível do “grupo de produção”. O “grupo” e a “brigada de produção” passaram a reter o excedente que produziam, além do que devia ser vendido ao governo, e a opinar sobre o planejamento comunal. Concedeu-se aos camponeses hortas familiares e o direito à moradia privada, a possuir um ou dois porcos, a vender a produção excedente no mercado local. Em 1962, as 24 mil “comunas populares” iniciais foram reduzidas significativamente. Estimam-se em dezenas de milhões de chineses mortos de inanição, devido ao Grande Salto. A economia voltou ao nível de 1957. (GUILLERMAZ, 1973. p. 251 et seq.; ESMEIN, 1971. p. 43 et seq.; MAITAN, 1969, p. 38; STÈLES, 2012.)


Com o enorme fracasso do Grande Salto, Mao Tsé-Tung e seu projeto de industrialização acelerada e deslocalização industrial rural perderam prestígio diante de boa parte dos quadros históricos do PCC. Em 18-28 abril de 1959, quando da reunião da Segunda Assembléia Nacional, Liu Shao-chi foi eleito presidente da República, em substituição a Mao Tsé-Tung. Dirigente comunista histórico, um dos poucos sindicalistas na direção do PCC, defensor do caráter inviolável das leis econômicas, ele era já o primeiro vice-presidente do Partido Comunista e o terceiro homem na nomenclatura chinesa, após Mao e Chou En-lai. Liu Shao-chi passou a expressar a política de correção do Grande Salto Adiante, ganhando prestígio entre a população, conquistando suas obras maior aceitação do que as de Mao Tsé-Tung. Mas o balanço sobre o desastre e suas razões não se realizou em forma explícita devido ao domínio que o “Grande Timoneiro” mantinha na mais alta direção, ou seja, no comitê central do PCC. (GUILLERMAZ, 1973. p. 251275; ESMEIN, 1971. p. 55.)


Correção sem autocrítica

Em agosto de 1959, na 8ª sessão do 8º Comitê Central, no lago de Lushan, em Pequim, o marechal e ministro da guerra Peng Dehuai, de origem camponesa, questionou as estatísticas manipuladas, o desperdício dos refeitórios comunais, o desequilíbrio entre as diversas áreas produtivas devido à falta de planejamento, o desastre econômico do Grande Salto. Teria proposto que, se o camponês chinês não fosse “bom”, o PCC teria conhecido sucessos iguais ao levante operária na Hungria, em 1956. Mao Tsé-tung e Lin Piao atacaram duramente o herói militar da guerra de libertação e comandante das tropas chinesas na Coréia. Resolução aprovada pela maioria do CC, não publicada na ocasião, anatematizou Peng Dehuai, acusado de se opor ao Grande Salto, de organizar tendência anti-partido e pró-burguesa, etc. Ele e seus apoiadores perderam os encargos e permaneceram no partido formalmente. Peng Dehuai iria ser maltratado quando da “Grande Revolução Cultural Proletária”. Apenas defenestrado, ele foi substituído, em setembro de 1959, por Lin Piao, na chefia do ministério da Defesa que, em outubro, publicou opúsculo defendendo e enquadrando o exército segundo a tradição da Guerra de Libertação e o “pensamento do presidente Mao”. Depurou-se o alto comando das forças armadas de aliados e simpáticos a Peng Dehuai. Lin Piao coordenaria a produção do “Livro vermelho” com 427 breves citações de Mao, espécie de catecismo do maoísmo que, por alguns anos, circularia na China e no mundo. (LOSURDO, 2012, 274.)


De 1959 a 1961, as reformas do Grande Salto eram seguidas formalmente e cada vez mais esgarçadas, onde haviam sido aplicadas. Em muitas províncias, o afrouxamento do planejamento central em favor da descentralização e das “comunas” permitira que as determinações centrais fossem obedecidas na forma e não no conteúdo e que fossem, não raro, desobedecidas. Mantiveram-se principalmente as “comunas populares” como organização administrativa e as “brigadas de trabalho”, já que a exploração associada das minúsculas parcelas camponesas era exigência material da produção. Sobretudo, seguiu o inexorável movimento de retificação do Grande Salto e o fortalecimento da economia mercantil: incentivos materiais no trabalho; liberdades aos mercados privados e à agricultura familiar; extensão das hortas privadas em detrimento das terras comunais, etc.


Sob a presidência de Liu Shao-chi e de sua equipe, consolidava-se a abertura à economia pequeno-mercantil sobretudo rural mas também urbana, apoiada e exigida por centenas de milhões de camponeses e dezenas de milhares de administradores comunistas. No novo contexto, propunha-se que o “grupo de produção” e mesmo o grupo familiar fossem responsabilizados totalmente pela produção agrícola. Exigia-se maior abertura e legalização para o artesanato, para as pequenas manufaturas, para a indústria ligeira cooperativada e mesmo privada. Propunha-se o direito de aluguel e de venda da terra. Os camponeses pressionavam para apoderar-se de terras comunais. Em verdade, essa proposta de programa era comumente aplicada sob a complacência das autoridades favoráveis a ela ou venais. Liou Shao-qi propôs que não mais de 15% das “comunas” funcionariam segundo as normas propostas inicialmente. Mesmos essas, comumente, mantinham contabilidade de suas contas restrita apenas ao “grupo de trabalho”, o que permitia todo tipo de desvios dos bens comunais. (GUILLERMAZ, 1973, 368.) Em 1962, Deng Xiaoping teria proposto que não importava a “cor do gato (fosse ele socialista ou capitalista) desde que caçasse o rato”. Ou seja, se o capitalismo avançasse mais a produção, na China, do que o socialismo, ótimo. Na URSS, quando da NEP, Nicolau Bukharin fora mais direto ao sugerir aos camponeses: “Enriquecei-vos”. Em 1964, Chu Enlai, primeiro-ministro desde 1949, segundo homem na linha do poder, propôs também a política das “Quatro Modernizações”, retomada mais tarde por Deng Xiaoping — Agricola, Industrial, Defesa, Tecnologia. (MANDEL In: MAITAN, 1999. p. 34 et seq.)


Sobre a luta entre o projeto de industrialização burocrático, autoritário, descentralizado e uma acumulação pequeno-mercantil, inicialmente sobretudo rural, que empurrava em direção da produção capitalista, Domenico Losurdo não diz quase nada. Sua explicação do fracasso do Grande Salto Adiante é sumária, ideológica, simplória. A iniciativa seria correta mas perdera o apoio camponês —apoio que jamais tivera—, pois “não se pode apelar em forma permanente e pela eternidade à mobilização, à abnegação, ao espírito de renuncia e de sacrifício e ao heroísmo das massas” (LOSURDO, 2013, p. 179, 79.) Portanto, o projeto não fracassara devido a sua incorreta implementação pela burocracia maoísta. Como veremos, a seguir, ele propõe que a Grande Revolução Cultural Proletária (1966-68) teria a “luta de classes como elo principal”, isto é, a oposição entre “burguesia e proletariado”, e, como objetivo, o desenvolvimento das forças produtivas materiais. Não diz de onde surgira ou se já existia uma burguesia na China e como a Revolução Cultural pretendia expandir a economia sem qualquer programa econômico e convulsionando a sociedade. Outra vez, explica quase nada e propõe axiomaticamente que a derrota da Revolução Cultural se devera também à incapacidade de se manter a mobilização ideológica da população. (LOSURDO, 2012, p. 79, 101, 174.)


A grande revolução proletária sem proletários

A partir de 1959, a tendência era o fortalecimento e ampliação das medidas de correção do Grande Salto, em desarticulação estrutural, com o fortalecimento no PCC da facção favorável à produção mercantil. Liu Shao-chi era o principal representante de bloco político-social que reuniria, nos seus extremos, setores minoritários preocupados com o planejamento central e a industrialização estatal e facções majoritárias favoráveis à economia mercantil. A imensa maioria dos camponeses desejava a abertura em direção da economia pequeno-mercantil e a posse-propriedade da terra, dos gados, dos instrumentos de trabalho, da moradia. O principal apoio da política de industrialização estatal era o minoritário proletariado industrial, controlado pelas estruturas sindicais do PCC e golpeado pelo Grande Salto, a descentralização industrial e o fim do planejamento central. A orientação da sociedade e da economia corroíam o poder do “Grande Timoneiro” sobre o PCC e terminariam reordenando a nomenclatura máxima comunista, em detrimento de Mao Tsé-tung, Lin Piao, Chou En-Lai. (DAUBIER, 1974.)


Mao Tsé-tung seguia sendo a primeira direção política da China e controlava a maioria do comitê central do PCC. Seu mais próximo aliado era o marechal Lin Piao, desde a deposição de Peng Dehuai, chefe do Exército Nacional de Libertação depurado, como vimos. O apoio ao maoísmo se enfraquecia nos quadros médios e inferiores, mais próximos das pressões das comunidades sobretudo rurais, favoráreis à orientação pró-mercantil simbolizada por Liu Shao-chi. Com as forças armadas já enquadradas, a ofensiva de agosto de 1959 de Mao Tsé-Tung e de sua facção, contra o marechal Peng Dehuai, foi retomada em 1963, através do “Movimento de Educação Socialista”. Ele foi espécie de prólogo da Grande Revolução Cultural Proletária, iniciada em 1966 e concluída, em 1968, com o defenestramento da maior parte dos quadros comunistas chineses históricos e o pleno domínio do alto comando do PCC por Mao Tsé-Tung e seus mais próximos seguidores.


O Movimento de Educação Socialista e a Grande Revolução Cultural Proletária acusaram duramente Liu Shao-chi e enorme parte da velha guarda do PCC de desvios culturais e ideológicos pró-burgueses e pró-restauracionistas. Em um viés idealista, muito próprio ao “Grande Timoneiro”, o Movimento de Educação Socialista e a Revolução Cultural propuseram afastar quadros comunistas desviados e tidos como irrecuperáveis e reeducar os definidos como recuperáveis —95%, segundo a direção maoísta—, sem tocar ou se referir às relações sociais de produção, que eventualmente gerariam e sustentariam aqueles desvios. Sugeria-se que as revoluções sociais de produção haviam sido revolucionadas, passando a serem socialistas, enquanto parte sobretudo de altos dirigentes seguiam com desvios burgueses e pró-capitalistas herdados do passado. Propunha-se, no frigir dos ovos, que a “existência não determinasse a consciência”, pressuposto básico do materialismo dialético. (ENGELS; MARX, 2007.)


A ênfase de combate super-estrutural, cultural e ideológico da Campanha de Educação Socialista e da Grande Revolução Cultural Proletária, sem questionamentos nem programas sócio-produtivos e de governança proletária, teria sido devido à consciência de Mao Tsé-Tung e de sua facção burocrática de que, por um lado, não contavam com o apoio das classes camponesas para combater os dirigentes da campanha de correção do Grande Salto. E de que, por outro, a gestão burocrática do Estado e o programa econômico que haviam implementado e seguiam defendendo não lhes permitiam mobilizar o proletariado industrial urbano que, mesmo minoritário, já não era desprezível. Como veremos, a Revolução Cultural pretendeu essencialmente defenestrar a alta direção do PCC, colocando-a, esperava-se, para sempre, sob o controle de Mao Tsé-tung e de seus fiéis.


O exército entra na briga

Os dois movimentos convulsionaram sobretudo a China urbana, de 1963 a 1968. Inicialmente, para defenestrar seus opositores novos e antigos, Mao e sua facção serviram-se do controle do comitê central do PCC e, quando isso se mostrou insuficiente, organizaram as “Guardas Vermelhas”, com mais de dez milhões sobretudo de estudantes universitários, com as aulas suspensas por semestres, já no contexto da Grande Revolução Cultural Proletária.(MASSARIN In: MAITAN, 1999. p. 111 et seq; ESMEIN, 1971. p. 115 et set.; DINUCCI, 1975, P. 80 et seq.) A seguir, as forças armadas, apresentadas pela Revolução Cultural como exemplo a ser seguido e como o “pilar fundamental da ditadura do proletariado”, sob o comando de Lin Piao, intervieram na ofensiva, secundando e enquadrando os guardas vermelhos. Todo a Revolução Cultural deu-se sob a inspiração do “pensamento do presidente Mao Tsé-Tung”, já sacralizado, e as diretrizes estritas do comitê maoísta encarregado de dirigir aquele movimento. (MAITAN, 1969, p. 125.)


Os “guarda vermelhos”, agindo em Pequim e nos grandes centros do país, atacaram a cultura ocidental como um todo —literatura, música, pintura, etc.—, derrubaram monumentos, renomearam ruas, invadiram universidades, ocuparam repartições administrativas, etc. (MAITAN, 1969, p. 89; DAUBIER, 1974.) Confrontaram-se com operários e camponeses, em geral inspirados pelos quadros do PCC restauracionistas atacados, resultando mortos e feridos nos embates, sem obterem os objetivos definidos pelo “Quartel General” da direção maoísta. A seguir, como proposto, as forças armadas passaram a secundar e a enquadrar os guardas vermelhos, que seguiram denunciando, prendendo, torturando, humilhando, em privado e publicamente, milhares de altas direções da capital e das províncias, refratárias e renitentes. Liu Shao-chi era o grande objetivo da campanha, que golpeou igualmente Deng Xiaoping. Alguns dos pró-burgueses foram executados. Quando o movimento concluiu-se, em 1968, com a formação de “comitês revolucionários” sob domínio maoísta, em todas as províncias, dois terços dos membros do comitê central havia sido substituídos. Estavam dadas as condições para a realização do 9º Congresso do PCC, em 1969, e consagração de Mao e seus delfins. (ESMEIN, 1971. p. 255 et seq.; JOYAUX, 1969, page 3.)


A Grande Revolução Cultural Proletária, movimento burocrático, hierarquizado e controlado pela facção maoísta, jamais se apoiou no proletariado, nem propôs maiores autonomia e poder para ele. Ao contrário, quando literalmente deu a permissão para que a Revolução Cultural envolvesse as fábricas, já que elas estavam se mobilizando contra o movimento, acusou de “economicistas” e reprimiu os trabalhadores que se organizaram em forma autônoma, em defesa de suas reivindicações, sobretudo em janeiro de 1967, com destaque para Xangai. O proletariado envolvido no movimento se dividiu e, em geral, os trabalhadores estatais opuseram-se à Revolução Cultural e ao igualitarismo camponês dos “guardas vermelhos”, em defesa de seus direitos e conquistas. (MAITAN, 1969, p. 118; TROTSKY, 1963, p. 515.)


Fim de festa

Em julho 1968, construído o domínio hegemônico da facção maoísta sobre as direções superiores do PCC, as Guardas Vermelhas, já relegadas a um segundo plano, foram dispersas, com a ajuda do exército, como já dito. (LOPES, 2020; ; DENUCCI, 1975, p. 118 et seq). Milhões de jovens estudantes e operários foram enviados para o campo para ajudar na produção agrícola, perder o hábito de se manifestar, minorar a incapacidade de absorção da economia de jovens diplomados. Em 1-24 de abril de 1969, em Pequim, realizou-se finalmente o 9º Congresso do PCC, com verdadeira canonização de Mao Tsé-Tung e de seu “pensamento”. Os delegados foram cooptados e não eleitos, criticando-se a fé cega e conservadora nas “consultas democráticas”. (GUILLERMAZ, 1973. p. 484; PIAO, s.d.)


O comitê central foi amplamente alargado, 484 membros com os suplentes, com o ingresso de novos chegados em geral desconhecidos. A velha guarda comunista, forjada na guerra de libertação, praticamente desapareceu, fora alguns poucos que se submeteram à nova realidade — 53 no total do CC. Mais de sessenta por cento dos membros do velho órgão supremo do PCC não participou do novo. Se realizava defenestramento da velha guarda, próximo ao ocorrido na URSS, sem o recurso aos massacres estalinistas. Numerosos militares foram designados como membros plenos do CC —25%—, com o fortalecimento do marechal Lin Piao como literal “príncipe herdeiro”. O grupo permanente do Burô Político foi constituído por Mao Tsé-Tung, Lin Piao, Chou En-Lai, Ch´em Po-ta, K´ang Sheng - dirigentes dedicados da Revolução Cultural, à exceção do terceiro, hábil transformista. A grande consigna do congresso foi continuar a “eliminar completamente a burguesia” — ou seja, os quadros ditos pró-burgueses. (GUILLERMAZ, 1973. p. 484 et seq.; PIAO, s.d. 97.)

A Grande Revolução Cultural Proletária e o 9º Congresso não promoveram modificações nas relações sociais de produção, sustando, quando muito, algumas iniciativas oficiais de “correção” do Grande Salto. Entretanto, a desordem motivada pela Revolução Cultural; a consigna de colocar a “política” na direção de todos os assuntos, que motivou o retraimento dos técnicos e administradores; etc. propiciaram retrocesso e desorganização na economia, situação que favoreceu o avanço da acumulação pequeno-mercantil através do país, no campo e nas cidades. (BETTELHEIM, 1976. p. 103 et set.) A ofensiva maoísta centrara-se nos quadros superiores e pouco se preocupara com a multidão de quadros médios e inferiores do PCC, em geral, pouco simpáticos para com a Revolução Cultural.


Como vimos, o esquerdismo retórico e super-estrutural da Revolução Cultural conquistou imenso público universitário europeu. Surgiram uma miríade de novos partidos, organizações, grupos, coletivos, etc. marxistas-leninistas, com destaque para a França e a Itália, que denunciava como “revisionistas” os partidos comunistas pró-Moscou, hegemônicos no grande operariado daqueles países. No Brasil, o PCdoB e facções da Ação Popular aderiram ao maoísmo e ao marxismo-leninismo. A convergência entre os USA e a China, em 1971 e 1972, ensejou enorme crise no movimento marxista-leninista, que, não raro, pôs-se sob a orientação da Albânia de Enver Hoxha.


O fim da retórica esquerdista

O movimento comandado por Mao Tsé-Tung e seus quatro escudeiros não dispunha de programa político ou de um bloco social sólido que o apoiasse. Ele perseguiu e conquistou, sobretudo, o domínio burocrático super-estrutural, com o literal afastamento do comando do país de toda a velha guarda que participara da fundação do PCC e da Longa Marcha, que não lhe fosse incondicional. Seu esquerdismo verbal, quando da Revolução Cultural e sua crítica à URSS pela sua tibieza na luta anti-imperialista se dissolveram rapidamente como sorvete ao sol. Em 15 de julho de 1971, o presidente Nixon anunciou viagem a Pequim, consolidando-se a aproximação China-USA que se manteria por décadas, praticamente até a administração Donald Trump (2016-2020). O movimento de aproximação iniciara no início do ano anterior, em torno de um ano após o 9º Congresso, que propusera o combate a “burguesia” no país. (CASA BRANCA, 20/05/2020.)


A nova situação causou um golpe duríssimo à URSS, então em confronto direto com a China, e ensejou imediata e radical reorientação da direção maoísta, que interrompeu o apoio às revoluções anti-imperialistas no Terceiro Mundo. (FRASSON, p. 24.) A aproximação do maoísmo com os USA fora uma facada nas costas da resistência vietnamita. Em 11 de setembro de 1973, a China fechou as portas de suas legações diplomáticas em Santiago aos que procuravam se refugiar do golpe militar, sequer recebendo os poucos marxistas-leninistas chilenos e seguiu tendo as melhores relações com a ditadura pinochetista. (MAESTRI, setembro 4-11, 2020.) Ao contrário, a URSS continuou apoiando a luta anti-colonial, ainda que em forma enviesada, com destaque para a África, o Afeganistão, etc., praticamente até a sua dissolução. Losurdo cala sobre tais fatos, apesar de sua gritaria sobre a inconsciência terceiro-mundista do “marxismo ocidental” e o anti-imperialismo do “marxismo oriental”, ou seja, chinês.


Em 13 de setembro de 1971, o marechal Lin Piao e membros de sua família; Huang Yungsheng, chefe do Estado Maior das forças armadas; o comandante da força aérea Wu Fa-hsien; Li Tso‐peng, primeiro comissário político da Marinha e outros altos responsáveis militares morreram em desastre de aviação na Mongólia, já longe das fronteiras chinesas, quando aparentemente fugiam para a URSS. Mais tarde, Lin Piao seria acusado de organizar golpe de Estado, preventivo à sua esperada destituição. Sabemos pouco sobre as razões políticas da pugna mortal no mais restrito círculo maoísta. Propõe-se que Lin Piao se opunha à aproximação estratégica com os Estados Unidos, apoiada por Mao e organizada por Chu Enlai (1898-1976), e que era favorável à modernização das forças armadas.

Os seguidores de Lin Piao foram defenestrados nos meses seguintes e se manteve longo silêncio sobre seu desaparecimento até se iniciar, mais tarde, campanha contra ele, no estilo da Revolução Cultural, denunciando-o como um “contra-revolucionário”. (DINUCCI, 1975, p.175 et seq.) Apesar de Chou En-Lai se tornar o segundo na linha de sucessão, Mao Tsé-tung, envelhecido e com problemas de saúde, entronizou Huo Guofeng, figura de segundo plano, como seu sucessor, antes de sua morte. Em 1976, após o falecimento de Mao, seguido pelo de Chu Enlai, Huo Guofeng liquidou sem maior dificuldades com o que restava da Revolução Cultural e ensaiou retorno à via soviética, barrada pela consolidação anterior do bloco político-social pró-mercantil. (MENDE, 1968, p. 8.)


Liu Shao-chi morrera maltratado durante a Revolução Cultural. Deng Xiaoping, reabilitado, assumiu o comando do país, retomando a orientação de seus antigos mentores. (LOSURDO, 2012, p. 83.) Ele expressava a marcha inexorável da acumulação mercantil com destaque para o mundo rural chinês, que conhecera aceleração com o fim do planejamento central e dos planos quinquenais, quando do Grande Salto e da Revolução Cultural. Lênin definira a NEP como “retirada” provisória “em vista de um posterior ataque”. Em dezembro de 1978, no Terceiro Pleno do 11° Comitê Central do Partido Comunista Chinês, oficializou-se “gigantesca e prolongada NEP”, uma “via chinesa para o socialismo” apoiada no mercado e no grande, médio e pequena capital nacional e internacional, sob controle rígido do PCC.(BUCHARIN; PREOBRAZENSKIJ, 1973, p. IX.) Era o fim da Era Maoísta ou Socialista Burocrática (1949-1978).


O fim da longa marcha

Para Losurdo, praticamente não há confronto de classes, contra-revolução ou ruptura de orientação na revolução chinesa, de 1949 até hoje. Há, quanto muito, breves desvios e retomada da orientação original. A abertura para a economia capitalista teria sido retomada quando se perdeu a “ilusão” em desenvolver as forças produtivas apoiando-se sobre o “permanente entusiasmo revolucionário de massa”. (LOSURDO,2013, p. 152.) Portanto, depois dos fracassos do Grande Salto e da Revolução Cultural. Em verdade, para o italiano, após “ruptura de breve período” no processo revolucionário, devido aqueles dois movimentos, “se impõe na China” a reorientação que levou a “retomar e reconfirmar o pacto social de 1949”. Ou seja, a “defesa da integridade territorial” e do “renascimento da nação chinesa” como objetivos fundamentais da revolução, sem preocupações socialistas. Abrindo-se logicamente espaço à “burguesia nacional” e ao capital mundial. (LOSURDO, 2013, p. 168, 173. 184.)


Portanto, sob a direção de Deng Xiaoping, teria iniciado uma “segunda revolução”, na qual se realizou, como política oficial, abertura estratégica ao grande capital internacional, com a conformação de uma burguesia chinesa cada vez mais poderosa. No 15º Congresso do PCC, em 12 de setembro de 1997, decretou-se a canonização da “teoria” de Deng Xiaoping, como o “marxismo da China” atual, ao lado do “pensamento” de Mao Tsé-Tung. (ZEMIN, 2000, p. 3 et seq.) A restauração do capitalismo na China não colocaria, segundo o autor, perigo ao socialismo chinês, já que se manteria a “expropriação política da burguesia”, sob o domínio exclusivo do autoritarismo vigente — propõe Losurdo, repetindo como sempre a ladainha justificativa oficial do PCC. (LOSURDO, 2012, p. 175; ZEMIN, 2000, p. 16.) Como se na URSS, não tivesse sido facção do partido PCUS, sob a direção de Gorbachov, a dirigir a restauração capitalista! A nova ordem nascente, o “socialismo de mercado”, constituiria, segundo Deng Xiaoping, uma “real contribuição à humanidade” e encorajaria o resto do Terceiro Mundo a livrar-se do peso da miséria e do subdesenvolvimento, ao adotar o exemplo chinês: muito capitalismo e muito mercado! ( LOSURDO, 2012, p. 189.)


Em 1979, foram definidas Zonas Econômicas Especiais, no litoral, escancaradas aos capitais internacionais, às quais se seguiram outras e, mais tarde, a abertura de todo o país à acumulação capitalista. Pôs-se fim ao planejamento central efetivo, procedeu-se a privatizações de milhares de empresas públicas, ensejando que milhões de trabalhadores estatais e suas famílias perdessem direitos à pensão, moradia, saúde e educação. Na nova ordem, esses serviços e bens passaram a serem pagos, em instituições privadas e públicas. O movimento de restauração capitalista gradual prosseguiu sem percalços, sob controle, causando importantes estragos sociais, até os sucessos da praça de Tiananmen, em 1989.


Não há paz na Praça da Paz Celestial

No contexto do processo de contra-revolução na Alemanha Democrática, na URSS e nas Repúblicas Democráticas, em 1989, na Praça da Paz Celestial, em Pequim, grande mobilização, de sobretudo estudantes, professores e intelectuais, passou a exigir a “quinta modernização”, além das quatro proposta por Chu Enlai e retomadas por Deng Xiao-Ping. Isto é, democratização da sociedade e do governo em um viés ocidental, em correspondência ao avanço da economia capitalista. Facções do PCC, muito fortes nas regiões em que o processo de restauração capitalista se adiantara, incentivaram, financiaram e apoiaram o movimento. Em Tiananmen, uma greve geral de “fome comunitária” foi coordenada para ocorrer quando da visita, em 15 de maio, a Pequim, de M. Gorbachov, defensor da “glasnost”, da “perestroika” e da restauração capitalista na URSS. Multidões de jornalistas de todo o mundo encontravam-se na capital chinesa para acompanhar a visita histórica. Em 18 de maio, o primeiro ministro Li Peng participou de negociações com a direção dos estudantes, apesar de pouco simpático ao movimento, à descentralização e à aceleração das privatizações. (BERGERE, 2000. p. 212-221.)


A burocracia dirigente chinesa dividiu-se entre a manutenção da centralização do poder e o fim do monopólio político do PCC, com a introdução de formas de multipartidarismo. Temendo a desordem, a facção centrista apoiou Deng Xiaoping que propunha, contra Zhao Ziyang, a repressão ao movimento e o prosseguimento da restauração capitalista sob a direção centralizada e autoritária do PCC. (MOTTOSI, novembre de 2020. p. 15; Novembre 2020, p. 13; luglio-agosto 2020. p. 19.) Em 18 de maio, o comitê central decidiu-se pela Lei Marcial e, semanas mais tarde, procedeu-se ao desalojo da praça, com a morte de cinquenta soldados e de quatrocentos a oitocentos manifestantes. Os dez mil mortos chorados pelo imperialismo não encontram comprovação em fotos, filmes, nomes, etc. (Massacre de Tiananmen, 23/12/2017.) Com a repressão do movimento, os reformistas políticos foram defenestrados, a concentração do poder nas mãos do PCC se fortaleceu e, muito logo, acelerou-se a abertura ao capitalismo.


Losurdo propôs como objetivo da Revolução de 1949 o desenvolvimento das forças produtivas e a reconstrução da unidade nacional chinesa, como proposto. “(…) por fim para sempre ao desmembramento do território nacional”, ocorrido durante o “século da humilhação”. (LOSURDO, 2012. p. 172.) Ao abordar a luta do PCC pela restauração territorial chinesa, criticou a falta de política e de habilidade da direção da URSS para com as minorias nacionais, pecado no qual, para ele, o PCC jamais incorrera, como assinalado. “Mao soube criticar os graves erros ocorridos na URSS na relação ao mesmo tempo com os camponeses e as minorias nacionais”. (LOSURDO, 2012. p. 68.)


Não precisamos retornar aos erros monstruosos de Mao Tsé-tung em relação aos camponeses, quando do proposto Grande Salto, esquecidos pelo italiano. E folga dizer que não são comparáveis os níveis de dificuldade postos pelos problemas de autonomia nacional, respectivamente, à direção soviética, em 1917, e à direção chinesa, em 1949. Herdeiros do Império Czarista, os bolcheviques defrontaram-se com mais de cem nacionalidades, em uma população geral com apenas 45% de russos étnicos. Em 1949, o PCC pôs-se à frente de uma população com mais de 94% de chineses da etnia han. (MANLIO, 1975, p. 27.)


Após propor o marxismo-leninismo (maoísmo) como arma fundamental na luta pela independência nacional e denunciar a violência do imperialismo ocidental contra a China, Losurdo defende ferozmente o programa do PCC de restauração das fronteiras chineses, após 1949. A questão de Hong Kong e mesmo da ilha de Formosa, ainda hoje independente, não lhe colocam maiores problemas. As duas regiões foram sempre partes do território nacional, povoadas majoritariamente por chineses étnicos. Ainda que a população de Taiwan deseje hoje a independência, em maioria.


O Tibete é chinês!

Losurdo embrenha-se em uma defesa miserável do imperialismo, do nacionalismo e do chauvinismo chinês han ao justificar o desrespeito do PCC da independência nacional do Tibete e da autonomia de fato das minorias nacionais da China, com destaque para as comunidades muçulmanas e de línguas próprias uigure e mongol. O italiano defende o direito da China sobre o Tibete. “(…) o imperialismo procura promover a secessão também do Tibete. (…) Qualquer simpatizante e militante da causa do anti-imperialismo” sabia “bem que a soberania chinesa (sic) sobre o Tibete tinha séculos de história pelas costas (…).” (LOSURDO, 2012, p. 201.) Ao igual que o pretenso direito da Coroa inglesa sobre a Escócia, ou de Madrid sobre a Catalunha e o País Basco —lembraríamos. Em derrapagem discursiva, o autor registra a existência nacional do Tibete como nação e o avanço chinês sobre ela no passado, ao contrário do que pretende, ao abraçar a proposta de que o Dalai Lama “exige a criação de um Grande Tibete, que incluiria não apenas o território que constitui o Tibete político na idade contemporânea, mas também a área tibetana na China Ocidental, em larguíssima parte perdida pelo Tibete já no século dezoito”. (Destacamos) (LOSURDO, 2012, p. 211.)


Losurdo propõe o direito histórico da China de recuperar o território perdido para o imperialismo no “século da humilhação” e nega ao povo tibetano o direito de recuperar os territórios e populações perdidos para o império chinês no passado! E apoia o direto chinês sobre o “Tibete político”, na opinião de, entre outros, Sun Yat-sen e Mao Tsé-Tung! Não “apenas Mao Tsé-tung”, mas também “Sun Yat-sen”, o primeiro presidente da República chinesa, consideram o “Tibete parte integrante do território nacional chinês”.(LOSURDO, 2012, p. 201-2.) Sancta simplicitas. Qualquer coisa como comprovar a soberania inglesa sobre as Malvinas apoiado na opinião da rainha da Inglaterra!


O Tibete é região de povo, etnia, língua e cultura singular, não chinesa, que conheceu a independência nacional por longo séculos, até cair sob o protetorado do Império Mongol, no século 13 e, mais tarde, do Império chinês, tendo porém gozado longos períodos de autonomia e independência. Em 1911, quando do estabelecimento da frágil república chinesa, o Tibete proclamou a independência, que manteve até 1950. Após 1951, a ocupação militar e política chinesa sobre o país tornou-se total, com a fuga do Dalai Lama, expressão conservadora dos direitos nacionais tibetanos, apoiada pelo imperialismo. Grande parte do país foi incorporada às províncias chinesas vizinhas e o restante deu origem a uma Região Autônoma formal, igualmente sob política assimilacionista.


A nova ordem propiciou a extinção de regime semi-feudal, reforma moderada da propriedade da terra, escassa modernização econômica, que se acelerou nos últimos anos com a restauração capitalista. Repetindo a retórica tradicional do colonialismo, Losurdo justifica o domínio colonial sobre uma região com a civilização que ele traria, ao igual que os ingleses que justificaram com a repressão do tráfico de escravos a invasão e o terrível escorcho de enormes regiões da África . “(…) não há dúvidas que hoje a situação do Tibete melhorou claramente no que se refere ao desenvolvimento econômico, à liberdade religiosa, e aos direitos culturais e nacionais dos habitantes daquela região.” (LOSURDO, 2012, p. 214.) O direito à plena autonomia das nacionalidades do império czarista, caso fosse a vontade de sua população, foi defendido pelos bolcheviques, antes da Revolução, sendo apresentado em opúsculo de J.Stálin, que teria sido escrito sob a supervisão de V. Lênin e N. Bukharin, em 1913.(STALIN, 1913.)


Apenas a Região Autônoma tibetana possui 1.228.400 mil quilômetros quadrados, com pouco mais de três milhões de habitantes. Mais três milhões de tibetanos viveriam nas regiões incorporadas diretamente a províncias chinesas. Sobretudo essas últimas regiões e populações sofrem forte pressão assimilacionista, por parte da população han, política governamental chinesa.(GUILLERMAZ, 1973, p. 278-283.) É certo que o imperialismo se sirva do Dalai Lama, da antiga ordem político-religiosa e do sentimento nacional para impulsionar movimentos conservadores pela independência tibetana e propaganda anti-chinesa. O que não justifica a anexação do Tibete e a política integracionista chinesa, como propõe Losurdo. As minorias uigures, mongóis, etc. não conhecem igualmente autonomia efetiva e são também objeto de políticas assimilacionistas.


Como conclusão

Fuga da História? A revolução russa e a revolução chinesa hoje, de Domenico Losurdo, tem como tese central a defesa do futuro radioso que se abriu para a China, sob a orientação máxima de Deng Xiaoping, em 1978, quando o país se escancarou para a produção e acumulação capitalistas, impulsionadas por capitais internacionais e nacionais. No ensaio, Domenico Losurdo defende a estranha tese que o “socialismo” na China não correria perigo pois o monopólio político mantêm-se nas mãos do PCC, precisamente o partido que comandou, após a derrota do maoísmo, a marcha em direção ao capitalismo! Destaque-se que, em fins dos anos 1920, o fortalecimento da produção capitalista na URSS era defendido pela facção direitista de N. Bukharin, um dos mais conhecidos teóricos bolcheviques. E que Gorbachov e sua clique restauracionista eram comunistas literalmente de “carteirinha”. O italiano não dá qualquer importância ao defenestramento com a Revolução Cultural de enorme parte da velha guarda do PCC.


Desde a última edição revista do citado ensaio, em 2013, não há como fugir do avanço inexorável da acumulação capitalista na China, com a regressão relativa da economia ainda em mãos do Estado. (CARVALHO, 2016) Hoje, o “Império do Meio” conta apenas com uma fortíssima burguesia chinesa. (FOLHA DE SÃO PAULO, 12 de abril de 2019.) Mais ainda, dotou-se de um dinâmico capital monopólico público e privado, que elevou a China ao status de nação imperialista, na acepção leninista da categoria. Ou seja, um país onde já domina o capital monopólico caracterizado e dependente da exportação de capitais. E, diante da crise mundial ensejada pelo Covid-19 e da ofensiva anti-chinesa dos USA, aceleram-se a abertura e a desregulamentação em favor do grande capital na China.

Um novo caráter daquele país que ensejou o inevitável confronto em desenvolvimento entre o imperialismo estadunidense, hegemônico militar, financeira e diplomaticamente, mas em estagnação econômica, e o imperialismo chinês, em diversas áreas ainda subordinado, que luta por conquistar espaço, apoiado no seu dinamismo manufatureiro. Mesmo nos seus momentos de maior desenvolvimento, a URSS jamais assumiu um caráter imperialista ao exteriorizar sua economia e seus capitais. Essa nova essência capitalista e imperialista da China já se materializara plenamente, diante dos olhos dos mais incrédulos, quando Losurdo publicou seu último ensaio no Brasil — O marxismo ocidental: como nasceu, como morreu, como pode renascer, toda uma apologia à restauração capitalista da China, através do “socialismo de mercado”.


Mesmo lusordistas irredutíveis abandonam a defesa do socialismo chinês, aceitam com reticências ou não o novo caráter capitalista do país, propondo comumente a influência positiva chinesa na política internacional, ao se confrontar com o imperialismo estadunidense. A necessária defesa do Estado e da nação chinesa, diante do ataque atual do imperialismo estadunidense, não deve servir de argumenta para a defesa da ação do capitalismo e do capital monopólico chinês, dentro e fora do país. Os trabalhadores não podem escolher uma “bandeira estrangeira”. (MAESTRI, 21/06/2019; KKE, Artigo, 19.02.2021.) Entretanto, o “socialismo chinês de mercado” é peça central na tentativa de impugnação perneta lusordiana do marxismo revolucionário. Ao ruir e ser descartado esse último, a China perde sua singularidade e se apresenta apenas como mais um “tigre asiático”, ou seja, uma outra nação oriental que se desenvolveu aceleradamente apoiada, em sua enorme população e mercado, na duríssima exploração dos trabalhadores e, condição imprescindível, em um enorme afluxo do capital.


A China se distingue de Hong Kong, Taiwan, Coréia do Sul, Singapura, etc. sobretudo por sua enorme população. Registre-se que aqueles países conheceram igualmente governos autoritários e centralizados, expressando os interesses capitalistas, ao igual do atual procedimento do PCC. A crise da narrativa do “socialismo chinês de mercado” desvela o núcleo essencial da formulação do italiano: a defesa do Estado, da nação, do nacionalismo, do autoritarismo político, do arroxo dos trabalhadores, da hegemonia da ordem capitalista e do capital. Tudo isso proposto como único caminho para a construção de nações e estados contemporâneos pretensamente autônomos. Com a agonia do “socialismo chinês de mercado”, o lusordismo se revela como apenas mais uma apologia capitalista, uma contorcida reflexão, prenha de hiatos e tropeços históricos e argumentativos de todo tipo, para defender, no seio da esquerda, a morte do marxismo e a vigência eterna do capitalismo. O lusordismo pode ser sintetizado na proposta: “Marx morreu! Viva o capital!”



Referências

  • Ascesa e declino dello stalinismo (1954). Documento approvato al IV Congresso della Quarta Internazionale (Segretariato Internazionale) nel 1954. Pubblicato il 4 ottobre 2012 da trotskismo.over-blog.it.

  • BERGERE, Marie-Claire. La Chine de 1949 à nos jours. 3 ed. Paris: Armand Colin, 2000.

  • BUCHARIN; PREOBRAZENSKIJ, E. L´accumulazione socialista. Roma: Riuniti, 1973.

  • BETTELHEIM, Charles. L´organizzazione industriale in Cina: e la rivoluzione culturale. Milano: Feltrinelli, 1976.

  • BETTELHEIM, Charles. Questions sur la Chine, après la mort de Mao Tsé-toung. Paris: Maspero, 1978.

  • CARR, Edward. H. La rivoluzione bolscevica. 1917-1923.Torino: Einaudi, 1964.

  • CARRILLO, Santiago. L’Eurocomunismo e lo stato. Roma: Riuniti, 1977.

  • CARVALHo, Miguel Henriques de. Evolução política e econômica da China no período maoísta.(1949-1978). (2016) https://www.excedente.org/artigos/a-evolucao-economica-e-politica-da-china-no-periodo-maoista-1949-1978/ (consultado de 01.02.2021.)

  • CORMIER, Jean. Che Guevara. Paris: Rocher, 1997.

  • Casa Branca. Departamento de Estado. Abordagem estratégica dos Estados Unidos para a República Popular da China. 20 de maio de 2020.https://www.whitehouse.gov/wp-content/uploads/2020/05/U.S.-Strategic-Approach-to-The-Peoples-Republic-of-China-Report-5.20.20.pdf;

  • COHEN, Stephen. B. 1888-38. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1990.

  • DAY, Richard B. Trotskij e Stalin: Lo scontro sull’economia. Roma: Riuniti, 1979.

  • DAUBIER, Jean. Historia de la Revolución Cultural Proletaria. (1970). 2 ed. Mexico: Siglo XXI, 1974.

  • DEUTSCHER. F. L´interregno di Krusciov. La grande contesa. Torino: Einaudi, 1961.

  • DINUCCI, Manlio. La lotta di classe in Cina. 1949-1974. Milano: Mazzotta, 1975.

  • DUBLA, Ferdinando. Il movimento del 68 e la genesi del marxismo militante in Italia. https://www.google.com/search?client=safari&rls=en&q=Il+movimento+del+68+e+la+genesi+del+marxismo+militante+in+Italia&ie=UTF-8&oe=UTF-8 (consultado de 01.02.2021.)

  • ESMEIN, Jean. Storia della rivoluzione culturale cinese. Bari: Laterza, 1971.

  • Folha de São Paulo, 12/04/2019. “Fundador do Alibaba diz que cultura de horas extras é uma "grande bênção”, Folha de São Paulo, 12.abr.2019. https://www1.folha.uol.com.br/mercado/2019/04/fundador-do-alibaba-diz-que-cultura-de-horas-extras-e-uma-grande-bencao.shtml. (consultado de 012.01.2021.)

  • FRASSON, Juliano P. O protagonismo de Henry Kissinger na elaboração e execução da política de reaproximação dos Estados Unidos com a República Popular da China. (1969-1972). TCC. Curso de Relações Internacionais. CEJURPS, Universidade do Vale do Itajaí, 2015. http://siaibib01.univali.br/pdf/Juliano%20Piva%20Frasson.pdf (consultado em 08.02.2020.)

  • FRYER, BROUÉ & NAGY. Hungría del ’56:revoluciones obreras contra el stalinismo. Buenos Aires: Ediciones del I.P.S., 2006. https://ceip.org.ar/Hungria-del-56 (consultado em 01.02.2020.)

  • GUILLERMAZ, Jacques. Storia del Partito Comunista cinese. 1921-1949. Milano: Feltrinelli, 1970.

  • GUILLERMAZ, Jacques. El Partito Comunista cinese al potere. 1949-1972. Milano: Feltrinelli, 1973.

  • STÈLES, Jisheng. La Grande Famine en Chine. 1958-1961. Paris: Seuil, 2012.

  • JOYAUX, François. Le IXe congrès du parti communiste chinois a confirmé les principes qui sont à l’origine de la révolution culturelle. Le Monde Diplomatique, Paris, Mai 1969, p. 3.

  • LÊNIN, V. O Imperialismo: fase superior do capitalismo. Germinal: Marxismo e Educação em Debate, Salvador, v. 4, n. 1, p. 144-224, jun. 2012. https://www.researchgate.net/publication/330373827_Imperialismo_fase_superior_do_capitalismo (consultada em 25.01.2020.)

  • LÊNIN, V. Teses de Abril. Sobre as Tarefas do Proletariado na Presente Revolução. Revista Movimento, 16 de abril de 2018.https://movimentorevista.com.br/2018/04/as-teses-de-abril/. (consultada em 25.01.2020.)

  • LOPES, Carlos. União Soviética: Algumas notas sobre Domenico Losurdo. Vermelho: a esquerda bem informada. 3.03.2019. https://vermelho.org.br/2019/03/13/uniao-sovietica-algumas-notas-sobre-domenico-losurdo/ (consultada em 20.01.2020.)

  • LOSURDO, Domenico. Fuga dalla storia?: Il movimento comunista tra autocritica e autofobia. Napole: La città Del Sole, 1999.

  • LOSURDO, Domenico. “Un universo concentrazionario ricco di contraddizioni”. Stalin: Storia e critica di una leggenda nera. Roma: Carocci, 2008.

  • LOSURDO. Fuga dalla Storia? La rivoluzione russa e la revolucione cinese oggi. 3 ed. Napoli: La scuola de Pitagora Editrice, 2012.

  • LOSURDO, Domenico. Stálin: história crítica de uma legenda negra. Rio de Janeiro: Revan, 2019 [2010].

  • LOSURDO, Domenico. O marxismo ocidental: como nasceu, como morreu, como pode renascer. São Paulo: Boitempo, 2018.

  • LETIZIA, Vito. A pesada herança histórica da China moderna. A grande crise rastejante. São Paulo: Caros Amigos, 2012.

  • LOPES, T. Camarinha Lopes. Charles Bettelheim sulla Rivoluzione Culturale Cinese. Bolletino Culturale, 17 maggio 2020. https://bollettinoculturale.blogspot.com/2020/05/charles-bettelheim-sulla-rivoluzione.html (consultada em 05.01.2020.)

  • MAESTRI, Mário. USA-China: A guerra está próxima? Tlaxcala: 21/06/2019 http://www.tlaxcala-int.org/article.asp?reference=26329 (consultada em 05.01.2020.)

  • MAESTRI, Mário. Hong Kong e Taiwan: o pecado mortal do Partido Comunista Chinês. Tlaxcala: 18/10/2019. http://www.tlaxcala-int.org/article.asp?reference=27234 (consultada em 05.01.2020.)

  • MAESTRI, Mário. Domenico Losurdo: um farsante na terra dos Papagaios. Porto Alegre: FCM, 2020. https://clubedeautores.com.br/livro/domenico-losurdo-um-farsante-na-terra-dos-papagaios (consultada em 05.01.2020)

  • MAESTRI, Mário. Domenico Losurdo: “Marxismo Ocidental” e “Marxismo Oriental” – Apologia da Colaboração de Classes. Esquerda Online. 18/02/2020. https://esquerdaonline.com.br/2020/02/18/domenico-losurdo-marxismo-ocidental-e-marxismo-oriental-apologia-da-colaboracao-de-classes/ (consultada em 01.01.2020)

  • MAESTRI, M. Santiago, 11/07/73: “A desmobilização. Discos e livros queimados. Sem saída”. In: Santiago: Minha participação na resistência armada ao golpe de 11 de setembro, SUL21, setembro 4-11, 2020. https://maestri1789.wixsite.com/mariomaestri/post/santiago-minha-participação-na-resistência-armada-ao-golpe-de-11-de-setembro. (consultada em 09.01.2020)

  • MANDEL, E. Le premesse di una rivoluzione antiautocratica. (1990). In: MAITAN, L. (org). La Cina di Tiananmen. Bolsena: Massari, 1999.

  • MASSARI, Roberto. Le Guardie Rosse di Mao. In: MAITAN, L. (org). La Cina di Tiananmen. Bolsena: Massari, 1999.

  • MAITAN, L. Partito, esercito e masse nella crise cinese: una interpretazione marxista della rivoluzione culturale. Roma: Samonà e Savelli, 1969.

  • MAO TSÉ-TUNG, “Sobre la táctica de la lucha contra el imperialismo japonés”, Obras Escogidas, Tomo I, Pequim, Ediciones em Lenguas Extranjeras, 1972.

  • MARIE, J.-J.Stálin. São Paulo: Babel, 2011.

  • MARIE, J.J. O socialismo do goulag. Resenha de Jean-Jacques Marie sobre Stálin: História Crítica de uma Lenda Negra, de Domenico Losurdo. Contrapoder, outubro de 2020. https://contrapoder.net/?s=Jean-Jacques+Marie&submit=Search (consultada em 09.01.2020)

  • ENGELS, F.; MARX, K. A ideologia alemã. São Paulo: Boitempo, 2007.

  • KKE. Artigo da seção de Relações Internacionais do CC do Partido Comunista da Grécia. A Formação, Ação e Dissolução da Internacional Comunista sob o Prisma das Tarefas Atuais do Movimento comunista Internacional. https://pagina1917.blogspot.com

  • MENDE, Tibor. Pourquoi la Chine doit renoncer au « grand bond en avant » et se rapprocher de l’Union Soviétique. Le Monde Diplomatique, Paris, Mai 1962, p. 8.

  • MENDE, Tibor. Pourquoi la Chine doit renoncer au « grand bond en avant » et se rapprocher de l’Union Soviétique. Le Monde Diplomatique, mai 1968, p.8. https://www.monde-diplomatique.fr/1962/05/MENDE/24726 (consultada em 05.01.2020.)

  • Massacre de Tiananmen : un récit cauchemardesque tiré d’archive. Le Monde, 23/12/2017. https://www.lemonde.fr/international/article/2017/12/23/massacre-de-tiananmen-un-recit-cauchemardesque-tire-d-une-archive-britannique_5233946_3210.html?xtref=https://www.google.fr/ (consultada em 05.01.2020.)

  • MOTTOSI, Giulio. La socialdemocrazia dall´alto di Zhao Ziyang. Lotta Comunista, novembre de 2020. p. 15;

  • MOTTOSI, Giulio. Chem Yun anticipa la centralizzacione fiscale e monetaria. Lotta Comunista. Novembre 2020, n° 598, p. 13;

  • MOTTOSI, Giulio. Tienanmen rivela l´equilibrio dei poteri. Lotta Comunista, n.599-600, luglio-agosto2020. p. 19.

  • Note su Domenico Losurdo. Da “marxista-leninista” a storico dei partiti falsi comunista. PMLI, 6.5.2009. http://www.pmli.it/biografialosurdo.htm (Acessado em 21 de janeiro de 2021.)

  • NUNES, Sidemar Presotto. Resenha. LOSURDO, D. Fuga da História? As revoluções Russa e Chinesa vistas de Hoje. Rio de Janeiro: Editora Revan, 2004. Revista HISTEDBR On-line, Campinas, nº 59, p.338-340, out2014. https://www.researchgate.net/publication/312658275_Fuga_da_historia_ As_revolucoes_russa_e_chinesa _vistas_de_hoje (Acessado em 21 de janeiro de 2021.)

  • NUOVA UNITÀ, 21/12/1976- “Teorici dell´asservimento”. Nuova Unità, Martedi, 21 Dicembre 1976.

  • NUOVA UNITÀ, Martedì, 14/11/1978, XV, nº 4, p.4.

  • (PESCE, Osvaldo) La lotta dei marxisti-leninista per il partito. Linea Proletaria. Milano: Pema, 11/1976.

  • PERRAULT, Gilles. L´Orchestre Rouge. Paris: Fayard, 1967.

  • PIAO, Lin. Rapporto al IX Congresso del Partito Comunista Cinese. Roma: Servire il Popolo, s.d.

  • STALIN, J. O Marxismo e a Problema Nacional. https://www.marxists.org/portugues/stalin/1913/01/01.htm

  • TROTSKI. El problema de la generaciones en el partido. 1923c. Disponível em: <http://www.ceip.org.ar/I-El-problema-de-las-generaciones-en-el-partido>. (Acessado em 21 de janeiro de 2021.)

  • TROTSKY, León. La révolution trahie. (1936). TROTSKY, León. De la Révolution. Paris: Les Éditions de Minuit, 1963.

  • TROTSLY, L. 1905: Bilan et Perspectives. Paris: Les Éditions de Minuit, 1969.

  • ZEMIN, Jiang. Teniamo alta la grande bandiera della teoria di Deng Xiaoping per un´avanzata integrale della causa della costruzione del socialismo con caratteristiche cinesi del XXI secolo. Napoli: La Città del Sole, 2000.

REVISTA ESPAÇO ACADÊMICO, N. 227 - MARÇO/ABRIL 2021, ANO XX, ISSN 1519.6186 - http://periodicos.uem.br/ojs/index.php/EspacoAcademico/article/view/57702


Recebido em 2021-02-06

Publicado em 2021-03-01


805 visualizações0 comentário

Posts recentes

Ver tudo

コメント


bottom of page